Avancemos!

Publicado por: Milu  :  Categoria: Avancemos!, FEMINISMO

“Um forte sentido de liberdade pessoal, associado à felicidade individual, é fundamental para sobreviver com boa saúde até uma idade muito avançada.”

Deepak Chopra

 

A Tomada de Consciência

Mais uma vez em prol da libertação da mulher, e reforçados que foram os meus sentimentos de  repulsa e de indignação com a notícia de Maus Tratos Sobre Idosos, publicada no Diário de Notícias do dia 14 do corrente mês, (aqui), que nos dá conta que, relativamente a Portugal, a violência sobre  idosos aumentou cerca de 30%, sendo as mulheres as principais vítimas, algumas delas a sofrerem em silêncio há mais de 40 anos,  apresento alguns excertos de um livrinho bastante assertivo que me veio parar às mãos, e que se intitula “Na Política, as Mulheres São Capazes“. Uma edição da Colecção “Bem Me Quer”, Nº 9, editado  sob a batuta da Comissão para a Igualdade e para os Direitos da Mulher – Presidência do Conselho de Ministros.

“Acontece muitas vezes passar despercebido o valor e o saber de mulheres muito capazes e muito qualificadas apenas por darem mostras de falta  de confiança em si próprias.”

“Todas nós temos opiniões sobre a sociedade e sobre a vida quotidiana. Se queremos ser capazes de contribuir para que as coisas sejam como achamos que deveriam ser, também precisamos de ter coragem para dizer abertamente o que pensamos, quando e onde são tomadas as decisões.”

“Não há dúvida que as mulheres não se envolvem muito na política. As grandes organizações que detêm o poder, assim como os órgãos eleitos por sufrágio popular, continuam dominadas por homens. Tal facto reflecte-se nas decisões tomadas e na definição das políticas: nem sempre favoráveis às mulheres como poderiam ser.”

“Há razões que explicam este domínio masculino e nós, mulheres, temos de assumir a nossa parte de responsabilidade neste estado de coisas. Aceitámos que, durante muito tempo, na sociedade, vigorasse a discriminação em função do sexo. Cabe-nos agora a nós querer participar, mas, ao mesmo tempo, é preciso que os homens modifiquem a sua atitude em relação às mulheres como políticas.”

Se quisermos tornar concreta «uma política à maneira das mulheres», temos que:

  1. Analisar a cultura dos políticos (isto é, os seus modelos, a maneira como actuam, o que verdadeiramente lhes interessa), os papéis que os políticos e os líderes desempenham;
  2. A cultura das mulheres (isto é, os seus modelos, a maneira como actuam, o que verdadeiramente lhes interessa), e os papéis que as mulheres desempenham.
  3. Assim, temos de definir a situação e examiná-la, pensar como poderá ser modificada e como dar um contributo válido para mudar a actual cultura política ou seja, a maneira de a fazer. Temos de desafiar as atitudes, as expectativas e as práticas profundamente enraizadas. E temos de ter a coragem de o fazer.”

“Não se pode deixar de reconhecer que a nossa cultura política actual – devido ao facto de ter sido sempre realizada por e para gente com poder – não é a melhor. Há regras e tradições que se entrincheiraram, e que acabaram por condicionar a evolução das pessoas, da política e das organizações. Criaram uma uniformidade entre os políticos, donde resultou quase não haver lugar para ideias novas e não convencionais.”

“Desde os primeiros contactos que as crianças vão tendo com a sociedade em que vivem, que rapazes e raparigas vão adquirindo experiências diferentes. Aqueles, influenciados pelo modelo masculino, que valoriza a força, a competição, a agressão, mas também a iniciativa e a acção. As meninas conformando-se com o ideal feminino, configurado, em grande parte, com a passividade e a sujeição, e, em contrapartida, com maior sensibilidade, afabilidade e disponibilidade. Aprendemos, assim, a exprimir-nos de modos diferentes desde a mais tenra infância: começa pelas cores dos casaquinhos, e, num ápice, desencadeia-se a adaptação ao desempenho dos papéis sexuais.”

“Como mulheres, temos de estar conscientes de que também nós contribuímos para a manutenção dos estereótipos pela maneira como educamos os nossos filhos e as nossas filhas. Se queremos mudar este estado de coisas, vamos ter de meter mãos à obra. E, assim sendo, também os homens terão de aprender a ser responsáveis por tarefas que dantes respeitavam apenas às mulheres.”

Anedotas e Caricaturas

Quando nos empenhamos a trabalhar para uma mudança de atitudes no campo de igualdade de direitos entre mulheres e homens, é preciso ter consciência de várias coisas.

  1. Não há dúvida que as anedotas, as caricaturas, os grafiti, contribuem para a manutenção de atitudes muito arreigadas, mas também é certo que são um sinal.
  2. Quando vemos as anedotas e as caricaturas dos homens políticos e as das mulheres políticas, verificamos que são consideravelmente diferentes. As imagens dos políticos e as anedotas sobre eles raras vezes se referem às suas características físicas abaixo do pescoço; no caso das mulheres, pernas, seios, etc., constituem geralmente alvo preferencial.

 

“Dupla Penalização: as Culpas e as Acusações”

 

“O que quer que se faça é mau:

Exemplo: A uma mulher com crianças pequenas que não trabalha fora de casa diz-se-lhe que é uma irresponsável e uma dependente, que devia ter um emprego, assumir as suas obrigações sociais e pagar impostos. Ensina-se-lhe tudo o que ela devia fazer e aponta-se-lhe o muito que haveria a esperar dela se ela quisesse ser útil à sociedade, o que não impediria que fosse uma boa esposa e uma boa mãe. Há quem pense que ficar em casa para tratar dos filhos não tem razão de ser.

Se uma mulher que é mãe arranja um emprego, ou é militante de um partido político ou de uma Ong, diz-se dela que não liga ao marido, nem aos filhos e os deixa ao Deus-dará; que a sua militância se faz à custa da família, que é egoísta, etc. Também se lhe lembra a sorte que tem de ter um marido compreensivo e inteligente. E o pior é que são muitas vezes as próprias mulheres a levantarem este tipo de acusações. Ora isto não pode acontecer.”

“Não é difícil fazer com que as mulheres se sintam culpadas ou falhadas. (…) Quanta mulher maltratada não acha que a culpa afinal é dela? Não acabou por ser ela quem provocou o homem, porque lhe disse, ou fez, isto e aquilo? E as que foram violadas? Quantas vezes não ouviram dizer que deram aso ao sucedido, ou que deviam ter pensado… etc. Por outras palavras: «não tinham nada que estar onde estavam». Ou porque nos saracoteámos, ou porque o decote era generoso – somos presa fácil. Haja o que houver, a culpa é sempre nossa.”

“Temos, decididamente, de trabalhar os nossos sentimentos de culpa e de vergonha, que nos oprimem. É assunto que há que resolver em conjunto. Uma das condições para isso é não lançar o descrédito, nem culpar as outras mulheres.”

Bibliografia

Comissão Para a Igualdade e para os Direitos das Mulheres. (2001). Na Política, as Mulheres São Capazes. Presidência do Conselho de Ministros. Lisboa.

 

 

 

E Delas se fez História

Publicado por: Milu  :  Categoria: E Delas se fez História, FEMINISMO

“Se entre os dois sexos, por efeito de diversa educação, não há uma perfeita igualdade, no sentido rigoroso da palavra, há, todavia, uma absoluta equivalência, e onde existe equivalência não pode encontrar-se inferioridade”.

(Regina Tavares da Silva, 1982:34).

Este meu post constitui uma breve abordagem de como nasceu o feminismo em Portugal, e tem como fim primordial, esclarecer os mais curiosos e curiosas sobre este movimento “a favor da emancipação da mulher portuguesa, entendido exactamente como tomada de consciência do valor da pessoa, como definição do seu papel na sociedade, e como contestação e revisão de preconceitos e limitações até aí impostos à mulher” (Silva, 1982:7).

Considero que nunca será demais falar da luta deste “punhado” de  mulheres que nos alvores  do século XX, empreenderam uma laboriosa luta contra o estatuto inferior da mulher, que então vigorava.

Tenho lido com alguma frequência, que nos últimos tempos o estatuto das mulheres mudou tanto, que será praticamente impossível retroceder. Aliás, Silva (1982:35) postulou essa mesma ideia quando disse que ““Com a concordância dos homens ou com a sua recusa, as feministas sentem e dizem que o processo é irreversível e o regresso ao passado impossível”. Contudo, não comungo dessa certeza. Tenho visto acontecer tantas coisas que ainda não há muito tempo pareciam impossíveis…  o mais seguro será mesmo promover a informação das jovens de agora, uma vez que tudo o que não custa a ganhar, também não custa a perder, logo, faz-se pertinente  avisá-las  para que se mantenham em alerta, pois que a roda tanto anda, como desanda… E ainda há quem gostasse de a ver a andar para trás…

O movimento feminista em Portugal começou a ganhar corpo nas primeiras décadas do século XX, quando umas poucas mulheres, oriundas da burguesia, o que faz dele um movimento elitista, começaram a pôr em causa os conceitos relativos ao papel da mulher na sociedade. De acordo com Regina Tavares da Silva (1982:7) “Com certo vigor a dado passo, o movimento feminista em Portugal é, no entanto, sempre um movimento moderado, nunca declaradamente subversivo nem violento, mais atento à satisfação das suas reivindicações pela força da persuasão, do direito e da educação do que pela força dos gritos e das manifestações”.

Foram as mulheres deste movimento feminista que “começaram a fazer ouvir a sua voz, chamando a atenção para a situação das mulheres, situação de inferioridade, quer legal, quer social, quer ainda cultural, e para a necessidade de a alterar, nomeadamente através de um processo de educação e de valorização a empreender urgentemente. Todas insistem neste aspecto, radicais e conservadoras, feministas confessas e não feministas declaradas” (Silva, 1982:8).

É importante referir que nem todas estas mulheres tinham os mesmos ideais sobre o papel da mulher na sociedade. Algumas achavam que a política não era para mulheres, ou que o lugar delas era mesmo a cuidar da família. Contudo, todas defendiam que a mulher deveria ser instruída, para melhor saber educar os seus filhos, quanto mais não fosse.

Cuidar da casa, do marido e dos filhos sim, mas sendo uma mulher sobretudo instruída, com bons conhecimentos de puericultura,  e livre de superstições ou  preconceitos de qualquer ordem. No que diz respeito às superstições, e tendo em conta que este tipo de crenças grassa em consonância com a  ignorância, chegou até a ser criado o Grupo das Treze, que reunia frequentemente, como para demonstrar às mulheres que não havia motivos para temer qualquer situação onde o número treze estivesse envolvido.

Do pequeno grupo de mulheres que se dedicaram à causa das mulheres  fez parte Alice Pestana, uma das percursoras radicais; M.ª Amália Vaz de Carvalho, a grande escritora, é uma não feminista profundamente preocupada com a educação das mulheres; Carolina Michaëlis de Vasconcellos, a eminente sábia, é também uma feminista consciente da carência e pobreza cultural das mulheres; Ana de Castro Osório é talvez a teórica mais notável do feminismo e uma das militantes mais empenhadas; Adelaide Cabete é uma das dirigentes mais impulsionadoras e prestigiadas da corrente feminista e das suas várias expressões” (Silva, 1982:8).

Mas afinal o que é o Feminismo, este termo que desde sempre tem sido conotado negativamente, ao ponto de algumas mulheres sentirem necessidade de dizerem que não são feministas, quando até são?

Antes de mais é imperioso esclarecer que o feminismo, o verdadeiro feminismo não pretende tomar o lugar do homem, muito menos imitá-lo nos seus padrões. Quando a mulher começou a fumar não foi certamente para imitar o homem porque os homens fumam, mas sim porque se fumar dá prazer, relaxa, enfim, porque é que a mulher, feita do mesmo barro, não poderia fumar também? A questão implícita no Feminismo é uma questão de igualdade, logo uma questão de direitos.

“Ana de Castro Osório, uma feminista radical e militante, numa obra que é talvez o primeiro livro declaradamente feminista desta época exprime o sentimento de vergonha e de ridículo que muitos, os homens e as próprias mulheres, sentem a este propósito:

«Feminismo: É ainda em Portugal uma palavra de que os homens se riem ou se indignam, consoante o temperamento, e de que a maioria das próprias mulheres coram, coitadas, como de falta grave cometida por algumas colegas, mas de que elas não são responsáveis, louvado Deus!…»” (Silva, 1982:13).

Então o que vem a ser o Feminismo nas palavras de uma percursora?

“O Feminismo é mais alguma coisa de grande e sublime, é a dignificação da mulher, é a consequência de uma evolução e por isso precisamos de vencer alguns prejuízos que entolham o nosso caminho. Àqueles timoratos que perguntam aonde irá o Feminismo parar responder-lhe-hemos: o Feminismo terminará onde acabam todas as ideias de Progresso, toda a esperança generosa, terminará aonde acabam todas as aspirações justas» (Adelaide Cabete, in Discurso de Abertura do I Congresso Feminista e de Educação).

Para compreender o incómodo que o termo Feminismo provocava em muitas mentes, e ainda hoje provoca, atentemos nesta história:

“Virginia de Castro e Almeida, na Introdução da sua obra «A Mulher», exprime em termos da sua própria evolução individual o conceito de feminismo que a anima. Educada numa atmosfera tradicional, como ela própria diz, com a «boa educação vulgar de todas as mulheres da minha classe, do meu tempo e da minha terra» (1), condicionada por preconceitos e tradições relativos à imagem e ao papel da mulher na sociedade, naturalmente que o feminismo lhe apareceu «sob um aspecto desprezível, cómico, disparatado, absurdo, por vezes monstruoso. Essa nobre concepção dos verdadeiros deveres e direitos das mulheres, não encontrava um echo indulgente na minha consciência. E depois… depois tive uma grande mestra, a Vida; essa mestra rude e prodigiosa cujos ensinamentos práticos nunca falham. Foi assim que o feminismo, que primeiro me aparecera sob a forma grotesca e vaga de uma utopia talvez perigosa, a pouco e pouco se transformou aos meus olhos numa grande e generosa ideia de redenção, que avança gravemente com a serenidade majestosa de todas as forças invencíveis destinadas a mudar a face do mundo»” (Silva, 1982:14-15).

“Transformação, mudança, redenção aparecem aqui como novos conceitos dinâmicos e complementares dos anteriormente expressos – a verdade,  a justiça, o progresso, a esperança – numa perspectiva idealista do objectivo último a atingir em todo este processo” (Silva, 1982:15).

“Elevação, libertação, nobilitação, dignificação, reabilitação – conceitos idealistas que se repetem e que vão enriquecendo um conteúdo de feminismo que se quer transformador e que se revela cheio de sonhos e de utopias” (Silva, 1982:15).

“na voz de Elina Guimarães: «… ser verdadeiramente mulher não é como para muitos ocupar-se apenas de frivolidades, de bagatelas ou então não ter no mundo senão a preocupação da rotina doméstica. Repudiamos tanto a boneca fútil como a serva embrutecida. Para nós a verdadeira mulher é aquela moralmente forte, intelectualmente culta, que dentro da sua esfera, qualquer que seja ela, cumpre conscientemente a sua missão social»” (Silva, 1982:18).

“À recusa do passado segue-se a promessa do futuro; à recusa da mulher oprimida, a proposta da verdadeira mulher; à missão limitada do passado, uma nova missão; ao destino marcado desde o berço, a escolha do próprio destino; à relação opressora, a relação de igualdade” (Silva, 1982:18).

“Em primeiro lugar, o estatuto da mulher está marcado desde o berço; a criança que nasce, se é do sexo feminino, tem logo à sua frente um caminho traçado e um estilo de vida imposto; por isso é saudada de modo diferente, e por isso se educa segundo padrões próprios e bem determinados” (Silva, 1982:18).

Quais eram, afinal, as reivindicações do movimento feminista português?

  • “O direito de voto como manifestação privilegiada da participação cívica e política;
  • A independência económica e consequente autonomia psicológica e afectiva da Mulher;
  • A educação das mulheres – tónica dominante do Feminismo Português” (Silva, 1982:23).

“A independência económica é um dos motes da propaganda feminista. A generalidade das defensoras do feminismo, que sobre este aspecto se debruçaram, encara-a como facto de libertação e garantia de emancipação efectiva. Em seu entender, a mulher não dependente economicamente quebrou uma das cadeias da grande corrente opressora que a envolve e a limita. Independente pelo seu trabalho, a mulher poderá tomar as suas próprias decisões, traçar o seu futuro, sonhar novas ambições, projectar-se num espaço mais vasto (Silva, 1982:27).

“A emancipação dada pelo trabalho e consequente independência económica tem ainda uma outra dimensão que, se bem que em termos menos definidos, é constantemente aflorada e está subjacente a todo este processo. É a dimensão da autonomia pessoal e da independência psicológica da mulher que se basta a si própria financeiramente. Essa mulher, porque pode decidir do seu futuro, sem pressões de ordem económica, pode também decidir dele em termos de afectividade, de gosto pessoal, de vocação própria. Porque não está condicionada a ver no casamento o seu único futuro socialmente aceite e o seu único meio de subsistência, essa mulher é necessariamente mais livre, pode saber o que quer e realizar aquela autonomia e independência psicológicas e afectivas, a que as feministas aspiram.

É ainda Ana de Castro Osório que exprime:

…«desenvolver livremente as qualidades afectivas na mulher – é deixar-lhe o pleno direito da escolha, o direito sagrado de amar ou não amar, de casar ou ficar solteira, sem que isso represente uma vergonha ou, pelo menos, um ridículo.»

Em resumo, os conceitos de independência económica facultada pelo trabalho da mulher e de autonomia psicológica e afectiva daí resultantes constituem elementos definidores do feminismo português, tal como ele é expresso pelas suas teóricas e defensoras” (Silva, 1982.29).

Sobre a educação das mulheres

“(…) o tema instrução – educação das mulheres é um tema constante e uma preocupação reiteradamente expressa pelas feministas portuguesas. Enquanto que em outros aspectos, incluindo os anteriormente referidos – sufrágio e independência económica – pode haver uma certa especialização no tratamento dos temas – escritoras que se preocupam preferencialmente com um deles e sobre ele insistem – neste, a insistência é praticamente unânime, como é unânime o reconhecimento dos males da situação das mulheres no aspecto educativo.

O estatuto de ignorância das mulheres é a base reconhecida e confessa de todos os males. Pior que a ausência de direitos cívicos ou políticos, pior do que a dependência económica, é a ignorância total da mulher, a total inércia intelectual e a total dependência que daí resulta. A par do analfabetismo literal das classes inferiores e, por vezes, não apenas destas, refere-se o analfabetismo cultural e intelectual das classes superiores, resultado de uma educação errada e deformadora que, desde a infância, é ministrada à mulher” (Silva, 1982.29).

“A educação-veículo para a manutenção de estereótipos, de papéis e imagens tradicionais para a mulher, a educação-moldagem a um ideal é agora substituída pela educação-veículo de transmissão de novos papéis e novas imagens e meio de libertação desse falso ideal” (Silva, 1982.33).

Em 1921, Aurora de Castro e Gouveia refere o tema menos comum de que é a própria educação que cria a diferença de aptidões e, em última análise, a discriminação:

“«Se homens e mulheres são irmãos, descendentes dos mesmos pais, se os progenitores varões transmitem as suas qualidades e as suas taras tanto aos filhos de um sexo como aos do outro, como é que o homem e a mulher podiam ter natureza e aptidão diversas? O que, de facto, acontece é que a diversa educação ministrada aos dois sexos, faz adquirir a cada um deles qualidades diferentes das do outro» (Silva, 1982.34).

“Com a concordância dos homens ou com a sua recusa, as feministas sentem e dizem que o processo é irreversível e o regresso ao passado impossível, que os tempos mudaram e uma nova consciência de si mesma pode fazer da mulher uma nova pessoa” (Silva, 1982.35).

 

Bibliografia

SILVA, T. Regina. (1982). Feminismo em Portugal na voz de mulheres escritoras do início do séc. XX. Presidência do Conselho de Ministros. Edição da Comissão da Condição Feminina. Cadernos Condição Feminina. Lisboa.

Sinais do Futuro

Publicado por: Milu  :  Categoria: Sinais do Futuro, SOCIEDADE

“Lá longe, ao sol, encontram-se as minhas aspirações. Poderei não alcançá-las, mas posso levantar os olhos, ver a sua beleza e acreditar nelas”.

Mark Twain

No dia 3 de Junho, participei num Seminário, subordinado ao tema (trans)Formar o Poder (trans)Formador da Formação, que teve lugar no Hotel Villa Batalha, que fica situado muito pertinho do museu da Batalha, ex-libris desta simpática vila.

Pois, no dito Semanário, e tal como sempre faço, fui retirando alguns apontamentos que no momento considerei mais expressivos e que decidi aqui partilhar. Contudo, estes meus apontamentos não representam a totalidade daquilo que fui absorvendo, que fui interiorizando, porque o mais importante, que é a inspiração, ou a satisfação sentida pela descoberta, e pela confirmação de muito daquilo que eu mesma já pensava,  não sou capaz de vos transmitir. Só aqueles que se encantam com o aprender, serão capazes de  perceber, de  intuir a minha emoção.

Aliás, talvez  até seja capaz de explicar a satisfação sentida quando se aprende, utilizando o seguinte  exemplo apresentado pelo psicólogo João Leite, na sua actuação no Seminário:

ECA – Os  Três Pilares da Aprendizagem

  1. Emoção
  2. Curiosidade
  3. Atenção

A Emoção é o que incendeia, pois não se aprende a seco. Repare-se que aqui estamos a falar de aprender e não de decorar matérias.

A Emoção faz despertar, produz a Curiosidade, que por sua vez, dá lugar à Atenção. E é nestes momentos, que alguns de nós, perante a descoberta, pronunciamos, ou sentimos interiormente,  um longo «Ahhhhhhhhh!!!».

Outra coisa a saber: Nenhuma competência nova aparece do zero. Seja qual for a competência, já alguma vez fizemos, ou estivemos em contacto com algo parecido. Por exemplo, o bisturi mestriamente manuseado pelo cirurgião, se bem repararmos, em muito se assemelha ao “empunhar” de um lápis, gesto que remonta para a infância. Logo, não se aprende sem fazer. Assim, todo o Formador, se quer que os Formandos aprendam, deve pô-los a Fazer.

Cabe agora também referir as Quatro Plataformas da Aprendizagem:

  1. Sensorial
  2. Comportamental
  3. Emocional
  4. Cognitiva

Sobre as Emoções, convém salientar que estas são uma fonte essencial da aprendizagem, já que  as pessoas, quer sejam as crianças, os adolescentes, os adultos e idosos procuram actividades e ocupações que fazem com que elas se sintam bem, e tendem, pelo contrário, a evitar actividades ou situações em que se sintam mal.

O Seminário teve a sua abertura oficial com a intervenção do Presidente do Conselho Directivo do IEFP. A. Valadas da Silva, que dissertou sobre Competências, que é obrigação do Formador desenvolver no Formando competências técnicas, mas também competências sociais e comportamentais. Que deve saber, também,” inspirar sonhos” e  “possibilidades de” no Formando. Que devemos usar de sensibilidade para assim operar a Mudança… começando pelos nossos filhos…

Já Cristina Botas, Directora DRH do CENFIM, professou que “o Formador deve de ser o Facilitador de Aprendizagens – Motivar, Influenciar, Transformar”. As emoções, o afecto, mais uma vez chamadas à colagem, assumindo-se como “uma mulher de afectos” quando proferiu que “cada formando que passa por nós [Formadores] deixa qualquer coisa de si”. Continuando que o “Formador deve ser uma referência”, não só deve formar com competências técnicas mas também incutir valores morais, em suma, deve Formar Pessoas.

Quanto a Jorge Rio Cardoso, Professor Universitário, este iniciou a sua intervenção confessando que nem sempre foi brilhante. Declarou que começou por ser um péssimo aluno. Chumbou duas vezes. Teve imensos problemas de auto-estima, para ele não existiam regras, etc. Contudo, uma mudança se operou nele quando enveredou pelo atletismo, actividade que lhe foi incutindo regras, como por exemplo, a necessidade de cumprir horários. Com o desempenho desta actividade teve também importantes conquistas: perdeu o medo de errar, de falhar.

No fundo, e agora sou eu que o afirmo – a vida é um jogo, e em todo o jogo, há momentos em que se falha, por isso se perde, mas também há momentos em que se ganha, momentos de vitória.

Referiu que qualquer formador tem que ter em linha de conta três princípios, os quais devem ser sempre observados no seu desempenho:

  1. “O que vou ensinar?”
  2. “Como vou ensinar?”
  3. “Como medir o sucesso?”

Para levar a bom termo a formação deve o formador encaminhar a Informação no sentido do Conhecimento e deste para a Sabedoria.

Para exemplificar esta “Trilogia” socorreu-se de um exemplo bastante simples, que irei tentar descrever, sei que não foi bem assim, mas penso que é suficiente para entender:

Num dia de manhã, ao acordar, você vai à janela e vê o céu carregado de nuvens cinzentas. De imediato,  forma-se em si a ideia de que possivelmente irá chover, pelo que ao sair de casa para ir para o emprego, à cautela, mune-se de uma gabardina e de um guarda chuva. Ora, neste gesto tão simples, tão corriqueiro, está implícito um mecanismo:

  1. A informação – sabe que o céu está cinzento, carregado de nuvens;
  2. O conhecimento – sabe que quando assim acontece, o mais provável é que irá chover;
  3. A sabedoria – Prevenção, previne-se para evitar um mal, uma constipação. É isto que é a sabedoria. Agir de forma a evitar um mal. Capacidade de projecção do que pode acontecer.

Assim, todo o Formador deve ter presente que todo o conhecimento a ministrar deve estar na direcção da sabedoria. E é esta competência que tenderá a ser muito valorizada nas empresas do Futuro – a capacidade de antecipar problemas aliada à capacidade de criar soluções.

Ninguém consegue aprender se estiver triste – afirmou Jorge Rio Cardoso. É, por conseguinte, imprescindível imprimir energia positiva.

Referiu também o Triângulo Pedagógico e a relação entre os seus três elementos, que podem ser conjugados de diferentes formas. Se em tempos, a relação privilegiada foi:

Formador ⇒ Saber ⇒ Aluno. Em que o Formador “despejava” o Saber sobre o Aluno, actualmente, a relação privilegiada é Formador ⇒ Aluno ⇒ Conhecimento. Ou seja, da interacção dos dois primeiros elementos, Formador e Aluno resulta o Saber ou Conhecimento. Ambos, Formador e Aluno aprendem. O papel do Formador é aqui o de Facilitador.

Legenda – Triângulo Pedagógico

Referiu, também, que actualmente não é mesmo nada fácil ser professor… Explicou como deve ser elaborada uma aula para ser bem sucedida. Primeiramente há que ter em conta que a 1ª aula é fundamental para prevenir a disciplina, ou seja, é o momento próprio para impor regras, para declarar ou negociar aquilo que pode e não pode ser feito na aula, podendo ser estabelecidas as sanções para punir os “delitos” cometidos.

É também importante elaborar o desenho da aula, tendo em conta que deve compreender os momentos de descompressão, mas de tal modo que permita retornar ao fio da meada assim que o queira. De 10 em 10 minutos deve o formador (professor) recapitular, fazer um ponto da situação, para dar oportunidade àqueles que entretanto se perderam no raciocínio ou se distraíram.

Algo que eu, que estou a elaborar este post, autora deste espaço,  considero extremamente importante!

O Formador (Professor) deve, também, ter as melhores expectativas sobre o Formando ou Aluno. Quando estamos perante alguém que consideramos capaz de aprender uma determinada matéria projectamos essa confiança nesse alguém, e então é isso que acontecerá. Ou seja, o que pensamos do Formando ou Aluno influencia os resultados. Por tudo isto impõe-se como importante formar as melhores expectativas sobre todos os Formandos ou Alunos.

Até porque a missão do Formador é tornar a pessoa capaz de aprender. E, por conseguinte, formar as pessoas para fazerem de si  mesmas bons cidadãos.

Deve o Formador ter sempre presente que constitui um modelo de referência pois mesmo sem se aperceber incute valores com o seu comportamento, com o seu desempenho, com a imagem de si que projecta nos outros.

“Mais do que cabeças que sabem muita coisa, precisamos de cabeças que sabem pensar.”

O Formador deve operar a mudança (transformação) nas  pessoas. Torná-las capazes de de dar opiniões, treinadas para soluções e conhecedoras de como buscar a informação que se impuser como pertinente.

O Formador deve criar empatia com os Formando mas de tal modo que não sacrifique as regras, tendo em linha de conta de que se não há educação sem valores, também não há educação sem afectos.

Por outro lado devemos fazer uma grande conquista que consiste em tornarmos-nos emocionalmente aptos, ou seja, identificar as nossas emoções e saber gerir essas emoções.

O Formador ou Professor deve ser capaz de influenciar os Formandos ou Alunos a encantarem-se pela vida, pois encantar-se pela vida, é, por consequência, encantar-se com o Conhecimento. Porque motivar para a vida  é ensinar que a vida engloba muitas coisas e uma delas é a escola.

Jorge Rio Cardoso fechou a sua admirável e brilhante intervenção de uma forma também admiravelmente brilhante – com Almada Negreiros:

“Quando eu nasci, as frases que hão-de salvar a humanidade já estavam todas escritas, só faltava uma coisa – salvar a humanidade.”

Almada Negreiros

Intervenção do psicólogo João Leite

Nos momentos iniciais da sua intervenção, João Leite chamou a atenção para o facto de andarmos a  utilizar o termo pedagogia mesmo quando estamos no âmbito de ensino dos adultos, mas que neste caso é de andragogia que se trata, uma vez que pedagogia é relativo a crianças. A ciência da Andragogia não é assim tão recente como se possa pensar, já que tem cerca de 60 anos. A primeira referência conhecida que lhe foi feita data do ano 1956.

Segundo João Leite já é tempo de deixar de ensinar e passar a investir na aprendizagem das pessoas. Quanto mais ensino, menos pessoas aprendem. Também de acordo com João Leite deve-se investir na Aprendizagem Significativa, em detrimento do Ensino Tradicional, e  que se traduz pelo seguinte esquema:

Recomenda que não se deve começar as aulas apresentando conceitos ou definições, já que só se aprende quando se consegue ligar as coisas, os assuntos. Só se aprende a partir daquilo que já se sabe, como se fosse uma escada, nunca a partir do zero.

Resumindo, o Formador deve tornar as pessoas capazes e uma vez capazes, livres e  autónomas.

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Jorge Rui Cardoso

João Leite

Cristina Botas

Ana Raimundo