Sem medo de ser mulher

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“Você precisa fazer aquilo que pensa que não é capaz de fazer.”

Eleanor Roosevelt

 

Porque nunca é demais insistir na problemática da violência contra as mulheres, eis mais um texto esclarecedor e formativo. Lutemos para que as mensagens construtivas e de liberdade nele constantes se tornem a realidade efectiva de todas as mulheres.

 

 

“«… A violência doméstica é um problema legal, económico, educacional, desenvolvimental, de saúde e, acima de tudo, é uma questão de direitos humanos

As Nações Unidas, em diversos documentos relativos a direitos humanos, assinalam este fenómeno como global, apresentando características semelhantes em países cultural e geograficamente distintos.

Apesar de atingir igualmente crianças, idosa (o) s, pessoas dependentes ou cidadã (o) s portadores de deficiência, a realidade indica que as mulheres continuam a ser um dos grupos mais vulneráveis a este tipo de violência que ocorre na intimidade das relações e do espaço doméstico.

«A violência contra as mulheres no espaço doméstico é a maior causa de morte e invalidez entre mulheres dos 16 aos 44 anos, ultrapassando o cancro, acidentes de viação e até a guerra.»

Durante muito tempo tolerada e silenciada, a violência contra as mulheres tem hoje uma visibilidade crescente, que não pode ser dissociada dos novos papéis sociais que as mulheres vêm assumindo em épocas recentes. Nos últimos trinta anos as mulheres conquistaram um conjunto de direitos que antes lhes eram vedados, o que contribui para um novo quadro de integração social.

Este fenómeno está radicado num sistema de crenças e valores patriarcais, que têm perpetuado as desigualdades de género. Neste modelo de dominação do homem sobre a mulher, a violência surge como um exercício de poder e controlo que assume diversas formas, desde a física à psicológica e sexual.

Num quadro de violência estamos perante pessoas fragilizadas, cuja trajectória pessoal e inserção social podem estar comprometidas. Para muitas destas vítimas, o impacto psicológico é sentido como o aspecto mais penoso e debilitante. Tende a afectar a sua auto-estima e a aumentar a probabilidade de problemas de saúde mental, como depressão, ansiedade, fobias e stress pós-traumático.

O combate a este fenómeno e a minimização das suas consequências passa pelo desenvolvimento de uma intervenção integrada, sistemática e multidimensional. 

A conquista de uma autonomia económica e emocional é um processo fundamental para que as mulheres possam reagir precocemente aos processos de violência. Promover o empoderamento das vítimas é devolver-lhes a segurança e o poder de decisão que anteriormente estiveram postos em causa. 

A participação cívica dos homens e das mulheres, na construção de uma cidadania activa e de uma sociedade mais igualitária, é fundamental no processo de mudança. Desde logo, na partilha das responsabilidades parentais e na construção de uma dinâmica familiar não violenta que sirva como modelo positivo para futuros relacionamentos das crianças. Por outro lado, promover um relacionamento familiar não conflituante é contribuir para o desenvolvimento de um espaço de autonomia e individualização das crianças e jovens. 

Torna-se assim necessária uma maior pró-actividade para que a mudança de valores, atitudes e práticas sociais possa acontecer, ou para que o desfasamento entre o reconhecimento dos direitos e a concretização seja cada vez menor.

O futuro revela-nos que, apesar de ainda termos um longo caminho a percorrer, há um número crescente de vozes femininas que denunciam os seus agressores e rompem o ciclo de violência. Isto só é possível porque a eficácia do sistema de apoio e protecção às vítimas ganha maior solidez e estas sentem-se mais confiantes para denunciar o crime de que são vítimas e exigir os seus direitos, participando assim activamente numa sociedade que se quer mais justa, solidária e igualitária.

Se o passado se construiu com desigualdades e diferenças de poder, o futuro faz-se com mulheres e homens que acreditam nos ideais da diversidade, da inclusão, partilha e da igualdade.”

 

Elza Pais in “Sem Medo Maria” (Fernanda Freitas, 2008).

Quando a roda, roda devagar…

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Sem Título

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“Continua apesar de todos esperarem que abandones. Não deixes que se enferruje o ferro que há em ti.”

 

Madre Tereza de Cacultá

«… Mais de metade da humanidade, homens e mulheres, vive no sofrimento. O sofrimento de se ser pobre, de se estar mal alimentado, doente, de ser iletrado, explorado. Mas é o sofrimento de se ter nascido mulher que agrava todos os outros…»

Christine Ockrent in “O Livro Negro da Condição das Mulheres”

Num dos jornais da nossa praça (aqui), foi publicada a notícia, que poderá ler abaixo, que a meu ver justifica o medo da vítima de violência doméstica em denunciar o agressor. Afinal, a protecção da vítima após ter feito uma denúncia é muito deficiente. E isso não poderia nunca acontecer! Neste post, pode também ser lido um pequeno excerto do livro “Sem medo Maria” da autoria de Fernanda Freitas, publicado no ano 2008, que nos mostra que,  de então para cá , e apesar de muita teoria, pouco se avançou nesta problemática. As mulheres continuam em larga escala a ser vítimas de violência doméstica e de homicídio, nalguns casos logo após ter feito a denúncia, como mostra a figura acima, relativa ao mês de Janeiro do corrente ano, 2015.

 

Notícia publicada no Público em 10 de Julho de 2015 com o título:

 

Apenas 10% dos condenados por violência doméstica vão para a prisão

“Nos crimes por violência doméstica, a maioria dos processos instaurados é arquivada – aconteceu em 300 casos de um total de 500 decisões judiciais comunicadas à Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG) entre Janeiro de 2010 e Junho de 2013. As 500 decisões do Ministério Público ou dos tribunais foram analisadas por investigadores do Observatório Permanente da Justiça Portuguesa do Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra, que concluíram: neste universo de 500 inquéritos, apenas 100 resultaram numa sentença em tribunal – 30 absolvições e 70 condenações (apenas 14% do total das decisões).

Mais:

nas condenações, as penas suspensas superaram em muito as penas de prisão efectiva, conclui ainda o estudo «Avaliação das decisões judiciais em matéria de violência doméstica». Assim, o condenado fica muito mais vezes em liberdade, e isso suscita dúvidas sobre os perigos para a vítima, apesar de alterações legislativas recentes passarem a prever que uma pena suspensa deve ser acompanhada de medidas da sua protecção.
As intervenções na sessão promovida Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG), para a apresentação de estudos científicos sobre a aplicação de decisões judiciais em casos de violência doméstica (do CES) ou de homicídio conjugal (da Escola de Criminologia da Faculdade de Direito do Porto), não se centraram tanto na protecção da vítima durante esse tempo em que o agressor fica em liberdade e a vítima exposta a ameaças ou novas agressões, mas na forma de melhorar a obtenção de prova, na investigação criminal.

Seria essa uma das formas de libertar a vítima do peso de ser ela o elemento central da prova e, muitas vezes, apontada como responsável pelos muitos arquivamentos, as poucas acusações e as muito poucas condenações – por se recusar, por exemplo, a depor em tribunal.
As apresentações dos estudos científicos estiveram, de forma geral, em linha com a percepção de que o decisor judicial se esquece “frequentemente” da vítima e de que “as penas são em regra leves”, nas palavras da secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade, Teresa Morais, que abriu a sessão no auditório novo da Assembleia da República.

Para Cândido Agra, professor da Escola de Criminologia da Faculdade de Direito do Porto e coordenador científico do segundo estudo apresentado na sessão, “é preciso prever para prevenir o crime”. E para tal, é necessário conhecer as motivações do agressor. “Os agentes destes crimes formam uma convicção de que é justo e legítimo pôr fim à vida da sua companheira. Depois há todo um processo de passagem ao acto”, explicou Cândido Agra que citou estudos académicos internacionais.
Quase 91% dos condenados são homens e quase 40% das situações tiveram como motivação a não aceitação do fim da relação, concluiu o seu estudo «Avaliação das decisões judiciais em matéria de homicídios conjugais» que analisou 197 decisões judiciais proferidas entre 2007 e 2012.

Outro resultado: “É no primeiro ano da relação conjugal que acontece a tragédia, na maioria dos casos”, afirmou. Em 39% das situações, o crime ocorre nos primeiros cinco anos da relação, e em particular no primeiro ano, existindo também “uma concentração do acto em relações com mais de 15 anos” (em 35,6% dos casos).
Teresa Morais valorizou o “investimento no conhecimento”, através destes dois estudos, para melhor atingir os objectivos de formar as pessoas envolvidas na prevenção deste fenómeno e de aumentar “a eficácia na prevenção”.
A procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal, concordou. Mas acrescentou que “proporia outros estudos”, além destes: “Estudos que nos dessem mais elementos no sentido de perceber quais são os procedimentos na investigação criminal adequados para que a prova seja efectivamente recolhida e válida em julgamento”, declarou, salientando que existe “uma tentativa de adaptar a organização do Ministério Público a uma melhor resposta a esta problemática”.

Na apresentação do estudo do CES, a investigadora Paula Fernando lembrou que, em caso de ida a julgamento, os processos podem durar mais de dois anos e considerou que, no caso dos arquivamentos, o “curto período de tempo” entre uma queixa e a decisão judicial (sendo na maioria dos casos inferior a três meses) “denuncia um desinvestimento na procura de outras provas na situação de não colaboração da vítima”. Tal acontece sobretudo “nos casos em que a vítima se recusa a prestar declarações”, lê-se no estudo.
 “A vítima é silenciosa. Mas ela também fala”, disse por sua vez a magistrada do Ministério Público Helena Gonçalves, em representação da Procuradoria-Geral da República. E quando não o faz, é preciso “ver a causa”. “Será que é a pressão familiar? A vergonha de revelar a sua situação?”

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“Sem Medo Maria de Fernanda Freitas (2008)

(…)

“A aplicação da lei por parte de alguns agentes públicos, nomeadamente forças policiais e autoridades judiciárias, é deficitária ou insuficiente, como preferirem.

Porquê?

A primeira preocupação de uma vítima de violência doméstica é a sua segurança. Ora, a medida de coacção necessariamente aplicada para que tal seja assegurado, é o afastamento do agressor de casa onde residem, mas na larga maioria dos casos não é aplicada pelos magistrados, As forças policiais que contactam com as vítimas nos momentos de crise, por muito boa vontade que tenham, e alguma formação específica que já lhes é dada, não suprem, nem podem suprir, a falta de uma política integrada e da falta de sensibilidade de alguns responsáveis de estruturas existentes mas burocráticas e não vocacionadas para uma resposta célere e eficaz. Uma das queixas é a da impossibilidade, com o novo figurino processual penal, de ordenar a imediata detenção do agressor que não se ponha em fuga.

Relativamente à punição, faltam claramente respostas a nível social.  Na maioria dos casos em que há condenação pela prática deste crime, há suspensão da execução da pena, muitas ou a maior parte das vezes sem qualquer sujeição do condenado a condutas ou medidas específicas. Ou seja, o agressor (que tem quase sempre dificuldade em interiorizar os contornos legais da violência doméstica) sai do Tribunal com a errada e perigosa convicção de que foi absolvido. E nem sequer percebe a censura de que foi alvo, ou até o risco que corre, em caso de reincidência, embora muitas vezes até perceba, mas esse entendimento não é suficiente para que venha mudar o seu comportamento, quer por factores endógenos (educacionais, psicológicos e psiquiátricos), quer por factores exógenos (stresse, alcoolismo, outras dependências, etc).

(…)

A advogada Conceição Brito Lopes, que trabalhou 20 anos na CIDM (Comissão para a Igualdade e Direitos das Mulheres) com particular incidência na matéria da violência doméstica contra as mulheres, deixa-nos aqui mais algumas considerações para reflectirmos sobre a actual legislação:”

«Apesar de algum progresso, a lei é fraca, ineficaz e incompleta, traduzindo a falta de importância que é dada a esta grave questão de direitos humanos das mulheres. A lei ocupa-se principalmente da violência física pois, apesar de referir, no art.º 152 do Código Penal, outras formas de violência, não é de forma nenhuma eficaz nem clara a forma como o faz. Como é costume em Portugal, criaram-se primeiro as leis, no papel, sem estudos, sem consultas às bases, às organizações de mulheres e às advogadas que lidam com este problema, sem cuidar de criar previamente condições para que se pudessem concretizar os desígnios nela previstos.

Como facto positivo em termos sociais e legais, refiro a maior visibilidade dada a esta matéria com a introdução de nova legislação. Mas não suficiente. As mulheres estão mais informadas, mas continuam a tratar-se estes crimes como se fossem uma «questão de mulheres» e não uma grave questão da sociedade e reiterada violação de direitos humanos sob o olhar complacente ou indiferente de cidadãos/as e Estado.

A legislação em matéria de violência conjugal masculina contra as mulheres sofre de diversos defeitos, nomeadamente a terminologia usada nos diplomas e que é indutora de erro: usam-se expressões como «violência contra as mulheres», «mulheres vítimas de violência», «abrigos para vítimas de violência», como se a violência que as mulheres sofrem fosse uma espécie de doença que lhes acontece e que tem de ser tratada, escamoteando totalmente a natureza da violência: comportamentos masculinos violentos.

O problema da «violência doméstica» não são as mulheres, são os homens;

as mulheres são apenas as receptoras das consequências do verdadeiro problema que os homens violentos e impunes representam.

Tudo aquilo que se ler como sendo «consequências da violência doméstica» leia-se como sendo problemas que os agressores criam à sociedade em geral e às mulheres em particular.

Se é a própria lei a escamotear a natureza do crime, impondo-lhe um rótulo/título que a generaliza e torna quase abstracta, como se espera que a nossa sociedade, tão pouco atreita em sair em defesa das mulheres agredidas e assassinadas pelos maridos e companheiros, tenha consciência cívica da realidade?

A lei e a sociedade estão de costas voltadas. Não existe a ideia que a violência conjugal masculina contra as mulheres seja aquilo que é:

um crime grave,

que mata muitas mulheres e que contribui largamente para o atraso da sociedade nas suas diferentes vertentes: económica, social, em termos de saúde, etc. E as leis penais ou outras nesta área, mal feitas, mal formuladas, ineficazes, suaves para com o criminoso, violentas para com as vítimas, são mais dissuasoras do que encorajadoras de acção por parte das agredidas. 

A legislação portuguesa está muito atrasada em relação ao que se faz há muito tempo noutras partes do mundo europeu e o apoio disponibilizado pelo Estado é pouco mais do que simbólico. Umas das disposições que podem proteger efectivamente as mulheres, como será a ordem do afastamento do agressor da residência onde vivem as pessoas ou pessoa agredida, não é funcional devido  remeter a sua concretização para uma fase bastante posterior à apresentação da queixa. Isto significa que a sobrevivente terá de fugir, passando a viver na maior precariedade e insegurança, habitualmente acompanhada de filhas/os, ou que aguardará em casa, ficando à mercê de um homem violento que sabe que foi apresentada queixa contra ele. Mas o afastamento do agressor é poucas vezes pedido judicialmente,  o que demonstra a sua ineficácia e a falta de interesse dos tribunais. O uso da pulseira electrónica para controlar os movimentos do agressor é uma medida tão óbvia e tão necessária, que se torna inaceitável que tal não seja feito.

A possibilidade de prisão preventiva é indispensável para tentar evitar ou reduzir a morte de mulheres às mãos dos maridos ou companheiros.

De uma forma geral considero que o legislador se preocupa mais em aliviar a consciência e passar ideias para o papel do que em tentar eliminar o cancro da violência que os homens exercem sobre as mulheres. Não serão as maiores penas de prisão que vão reduzir a incidência da violência masculina sobre as mulheres, mas sim medidas de sensibilização e informação em geral, e o empoderamento das mulheres, criando-lhe condições para que não caiam tão frequentemente em situações de risco de vida ou para que saibam sair de tais situações.

E ao Estado incumbe essa tarefa, que tão mal executa.

Na minha opinião a ineficácia das leis leva ao seu incumprimento, passando a mensagem que a violência conjugal masculina contra as mulheres não é prioridade.»


Bibliografia

FREITAS, Fernanda. (2008). Sem Medo Maria. Caderno. Alfragide. pp. 182-186.

O ovo da serpente

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“Se Deus é macho, então o macho é Deus. O patriarca divino castra as mu­lheres enquanto ele for autorizado a viver na imaginação humana.”

(Mary Daly)

Li há algum tempo que tinha dado entrada no Parlamento um projecto de revisão da lei do aborto, uma iniciativa do Movimento Pró-vida, promovida pela Federação Portuguesa pela Vida. A ideia subjacente é voltar a pôr o tema do aborto na agenda política, oito anos depois de ter sido realizado o referendo que deu o «Sim» à despenalização da interrupção voluntária da gravidez.

Em duas  notícias do Jornal Observador aqui e aqui, podemos ler declarações de Isilda Pegado, coordenadora da Federação Portuguesa pela Vida, tais como:

Na iniciativa legislativa  “não estará a penalização do aborto” mas antes a inclusão de “cláusulas protectoras da vida humana”. A chamada Lei de Apoio à Maternidade e Paternidade – Do Direito a Nascer (clique aquipretende que o pai seja chamado ao processo decisório de interrupção da gravidez, que o Estado passe a disponibilizar “meios de ajuda efetiva” para mulheres em dificuldades sociais e que as mulheres que abortem deixem de poder gozar licenças de parentalidade pagas a 100% pela Segurança Social. “Estamos a viver uma crise de natalidade. Em oito anos, vimos mais de 150 mil vidas serem eliminadas. Fazem muita falta ao país”. “Temos conhecimento de que há milhares de mulheres que ficam destruídas [após o aborto]”, acrescenta.“Exigimos uma revisão da lei do aborto, porque não pactuamos com a destruição de vidas que o país está a assistir”.

Mas, no meu entender, o que esta lei pretende é dificultar a vida à mulher. Principalmente isso!

Porque entre muitas outras coisas, esta lei sugere a implantação de taxas moderadoras, específicas para os casos de IVG. Portanto, dinheiro à frente. E quem o tem está sempre safo, quem o não tem sofre as consequências. A pobreza! Que lixa sempre a mulher!… Exige, também, que a mulher seja confrontada com a ecografia e a assine, o que configura  uma técnica de terrorismo, pois aumenta o sofrimento de quem já está a sofrer.

«querem essas mães a oscilar entre o hospício psiquiátrico, o bordel e a cadeia e as crianças nos asilos-bordeis (q.e.d.) de onde passarão às cadeias (é exactamente assim, porque tem sido exactamente assim). (…) Talvez seja o momento de pedir formalmente à CIA (ou à presidência dos USA) a lista dos 500 nomes com relevância política e económica no território que a CIA registou (segundo um agente seu declarou diante de metade do mundo) como clientes da rede da Casa Pia»

Joseph Praetorius, in Facebook, 27/06/2015)

Ora, como eu penso que uma mulher só faz aborto se quiser, pois ninguém a poderá obrigar, considero que este projecto de lei é um ataque contra a liberdade e direitos humanos da mulher. Considero que em todas as circunstâncias que influenciem a sua vida, a mulher deve ter o direito de decidir como bem entender. Deste modo, a mulher que não quer em hipótese alguma fazer um aborto, deve mesmo assim conceder o direito a outra mulher de o fazer.

Mais nada.

Se a mulher que tiver feito um aborto se vier a arrepender… paciência. A vida é isso mesmo. A vida é feita de escolhas, e quando se faz uma escolha está-se simultaneamente a fazer uma renúncia.

Há um trecho na  Lei de Apoio à Maternidade e Paternidade – Do Direito a Nascer que até é verdade:

«As mulheres tantas vezes na solidão, são vítimas de pressões sociais e afectivas e por isso obrigadas a abortar. A lei não tem meios de protecção, deixa a grávida entregue à sua sorte.
Os abusos, sempre condenáveis, movidos contra grávidas ou mesmo apenas quando expectantes da maternidade feitos em ambiente laboral e tão noticiados, são também consequência daquela falta de protecção».

Mas, neste caso, a decisão mais sensata é promover a mudança da lei no sentido de criar condições apropriadas para criar crianças e, depois,  espere-se! Com o tempo e muito naturalmente, o número de abortos tenderá a diminuir.

Para a anacrónica Isilda Pegado tenho algumas observações a fazer, tendo em conta as suas declarações, expressas no jornal acima citado.

Primeiro: que a mulher deve ter filhos quando entender e por amor. Só por isso. Nunca pela preocupação de povoar.

Segundo: que muitas mulheres ficam destruídas após terem feito um aborto, acredito que sim. Mas esse sofrimento provocado pelo arrependimento é em grande medida consequência da tradição que tem origens ancestrais: fazer da mulher sempre culpada. Seja o que for e como for, a mulher é sempre culpada. Neste caso a maternidade, faculdade da mulher, funciona como uma armadilha. O homem, aquele que fez o filho, esse, está sempre no Céu, ou a voar livre como uma borboleta. Posto isto, tudo quanto limite a liberdade da mulher é um perigoso retrocesso civilizacional.

Senão vejamos este excerto retirado do livro «Sem Medo Maria» da autoria de Fernanda Freitas, que nos mostra o antes e o depois, ou seja, a razão pela qual não devemos andar para trás, no que diz respeito aos direitos e liberdades da mulher.

Antes

“De acordo com uma resenha histórica da Associação Portuguesa de Mulheres Juristas, havia na Europa algumas normas que permitiam a punição correctiva caso a mulher desobedecesse, nomeadamente com «uma vergasta de espessura  não superior à do seu dedo polegar». Ainda neste documento está transcrito um excerto de um texto de Direito da Flandres do século XIV em que se pode ler: «o marido pode bater na mulher, cortá-la de alto a baixo e aquecer os pés no seu sangue, desde que a torne a cozer e ela sobreviva»!

Em Portugal, havia nas Ordenações Filipinas, a permissão para «castigo moderado, submissão a cárcere privado e a morte em caso de adultério».

Em meados do século XIX, por exemplo, no Código Civil de 1867 havia clara referência à posição subalterna da mulher, impondo-lhe o dever de obediência ao marido que devia «dirigir a mulher». Já o Código Penal «conferia legitimidade social ao poder de direcção do marido», não previa ilicitude na questão dos maus tratos ou até na violação de correspondência da esposa e chegava ao ponto de ter um enquadramento diferente para o adultério do marido e da mulher.

O Código Penal de 1886 permitia ao marido matar a mulher em flagrante adultério, sofrendo um desterro de seis meses para fora da comarca.

No Código Civil de 1966, a mulher casada beneficiava de um estatuto menor. O marido era reconhecidamente o chefe de família, com poder de decisão na generalidade dos assuntos da vida do casal, administrando todos os bens, incluindo os bens próprios da mulher. À mulher estava reservada a gestão doméstica. Apesar de atribuir a ambos os pais a guarda e regência dos filhos, o artigo 1881.º atribuía especialmente ao pai, como chefe de família, os poderes de defender, emancipar e representar os filhos, bem como os de orientar a sua educação e administrar os seus bens.

Este estatuto de subalternidade foi sendo mantido ao longo dos anos; em 1969, por exemplo, os contratos de trabalho celebrados com mulheres casadas eram válidos, mas concedia-se ao marido a possibilidade de se opor à sua celebração ou manutenção.

Na época, as mulheres não podiam (por lei e até 1974) aceder à carreira diplomática e da magistratura, e se decidissem ser enfermeiras ou hospedeiras do ar, perdiam o direito ao casamento.

Depois

 

A Constituição de 1976 veio consagrar o princípio da igualdade de direitos e deveres de ambos os pais em relação aos filhos.

O direito ao trabalho, como direito fundamental de todos os cidadãos é finalmente consagrado, devendo o Estado assegurar a igualdade de oportunidades na escolha da profissão ou tipo de trabalho com igual retribuição, sem distinção de sexo.

A Reforma do Código Civil, em 1977, aboliu finalmente os artigos referentes às discriminações das mulheres casadas, promovendo a igualdade de direitos e deveres dos cônjuges, confiando a direcção da família e a administração comum dos bens do casal a ambos. O exercício do poder paternal [poder parental] é confiado tanto ao pai como à mãe.”

Bibliografia

FREITAS, Fernanda. (2008). Sem Medo Maria. Caderno. Alfragide. pp. 177-180.