O AROMA DO DESEJO

Publicado por: Milu  :  Categoria: O Aroma do Desejo

O AROMA DO DESEJO
De
Rachel Herz
(Investigadora da Brown University)

Rachel Herz é uma especialista da psicologia do olfacto reconhecida mundialmente. Além de trabalhar na Brown University, presta-se como profissional do olfacto a frequentes entrevistas, quer na rádio quer na televisão. É uma presença assídua no Canal Discovery, no ABC News, na BBC, na Nacional Public Rádio e no Canal Learnig. Expostos em museus da ciência estão alguns dos seus trabalhos. A Scientific fez um artigo com o seu perfil, o The New Yorquer, o New Times, as revistas Time e O e o The Oprah Magazine entrevistam regularmente Rachel Herz.

“O Aroma Do Desejo”, é uma obra sobre o estudo do olfacto da autoria da investigadora e especialista Rachel Herz, que nos elucida sobre como funciona o sentido do olfacto, o qual tem vindo a ser, até há bem pouco tempo, algo preterido como objecto de estudo da ciência, devido à crença bem popular, no axioma da sua relativa importância. Contudo, para os nossos ancestrais, o olfacto foi o primeiro sentido a desenvolver-se porque imprescindível para a sua sobrevivência, já que permitia “cheirar o perigo”!… Com o decorrer do tempo e a evolução da humanidade houve um processo gradual de adaptação que exigiu outras respostas em relação ao meio, pelo que, o olfacto, perdeu a sua importância em relação aos outros sentidos. Os recentes estudos provam que existe uma correlação entre a saúde emocional e a saúde olfactiva. A anosmia, diminuição ou perda de olfacto, pode resultar de acidentes traumáticos mas, também, pode ser causada por depressão ou esta pode, por sua vez, causar anosmia! O nariz humano tem capacidade para captar e destrinçar entre dez a quarenta mil odores! Os perfumistas ou mesmo os chefes de cozinha conseguem concretizar a proeza de distinguir até cem mil odores! A capacidade olfactiva requer aprendizagem, um odor está sempre associado a uma determinada e peculiar situação. Conhecemos o aroma a castanha assada porque já as provámos, assim como é possível termos visto assar castanhas. Uma situação facilmente reconhecível é o odor a hospital. De certeza que ninguém gosta, porém, para os profissionais de saúde, não é razão para qualquer incómodo, visto que, expostos continuamente ao mesmo odor sofreram um processo de acomodação, o que na prática significa que não dão por ele, como se tal não existisse. Por vezes damos conta, de não gostarmos de um determinado aroma, às primeiras impressões não encontramos qualquer explicação para esse facto, todavia ela existe! É possível que, na primeira vez em que entrámos em contacto com esse odor, nos encontrássemos num estado emocional negativo. Por outro lado, gostar muito de um certo aroma pode estar relacionado com algum episódio feliz da nossa vida, assim mesmo revelador, de que, o primeiro contacto odorífico aconteceu num momento positivo do ponto de vista emocional. Neste contexto, o olfacto pode evocar, subitamente, recordações de um passado longínquo, ao reconhecer um aroma que esteja relacionado com acontecimentos agradáveis ou não, por nós vivenciados. Isto não significa que, as recordações despoletadas pelos odores, possam ser tidas como absolutamente precisas no que consta a dados de informação, já que, estas memórias têm, tão só, o condão de nos envolverem num mar de emoções! Eu mesma, já por diversas vezes, ao inalar certos odores, fui acometida pelas denominadas memórias proustianas! Quando por um feliz acaso, às minhas narinas assome, o aroma da cera tradicional para madeira de soalhos, imediatamente, nesse preciso instante, sinto-me reportada para a minha infância. Todos os anos, eu e a minha família tínhamos o hábito de passar a Páscoa na pequena aldeia, terra natal dos meus pais. No fim-de-semana, véspera desse santo dia, instalava-se, nas nossas rotinas, um verdadeiro rebuliço! Como não tínhamos automóvel, fazíamo-nos transportar num velho autocarro que roncava estrada fora, destilando espessos gases pelo escape que me prostravam em terrível agonia. Chegada ao destino, mais morta do que viva, nem direito tinha à desejada atenção da minha mãe, já profundamente envolvida, na missão imperiosa de limpar a casa a fundo, especialmente a sala, no intuito de tudo pôr limpo e arejado, verdadeiramente digno, de receber o Senhor! No grande dia, o soalho da sala parecia um espelho e recendia um divinal cheiro a cera! Era para este chão, tão primorosamente cuidado, que o padre, após ter arrebanhado de um prato, estrategicamente poisado na mesa, um envelope que continha dinheiro, deitava mão a uma saca de onde trazia um punhado de confeitos e, num gesto largo, como quem atira sementes à terra, espalhava aquelas bolinhas pequeninas e doces, pelo chão! Sem qualquer cerimónia, ainda na presença do padre, eu e os meus dois irmãos, mergulhávamos de cabeça, sôfregos, daquelas raras gulodices que nos tinham caído do céu!… Seguia-se, então, uma luta renhida, na mira de conseguirem, cada um para si, o maior número de confeitos! Por norma, era eu quem mais conseguia apanhar, o que me fazia sentir uma sensação de ufana vitória! Esta memória que carrego e que volta e meia renasce, despoletada pelo odor a cera, provoca dentro de mim uma súbita emoção prenhe de infinita ternura, pela criança traquina que um dia fui!… Há no mercado um perfume, cujo aroma se assemelha a um outro que usei nos meus tempos de juventude! E que tempos áureos aqueles! Sempre que o uso é como se tivesse derramado sobre mim uma poção mágica… Sem mais nem menos, sinto-me invadida por uma emoção capaz de me devolver o estado de espírito que então vivi! Faz-me sentir magnânima, livre, confiante e até bonita, vejam lá!!

Neste livro podemos tomar conhecimento de um verdadeiro artifício da natureza, consta que, a mulher consegue distinguir, no odor exalado por um homem, se o código genético que transporta é compatível com o seu. Não que tenha um nariz de longo alcance, nada disso, basta que o cheiro lhe agrade, para tão logo saber que, com um determinado homem poderá ter filhos saudáveis, aspiração máxima de todas as mães! Já agora uma importante revelação para eles! Um homem que usa perfume exerce sobre a mulher um poder de sedução preocupante, já que esta se deixa inebriar, correndo o risco de errar na selecção natural e envolver-se com alguém incompatível do ponto de vista genético. Ainda que tenha ocasião de sentir o verdadeiro odor desse homem, uma vez que se encontra entrosada sentimentalmente é incapaz de se desligar! Eu, pecadora, me confesso! Há lá coisa melhor do que um homem bem cheiroso?

O olfacto é o sentido que espicaça o desejo, por isso, actualmente alguns estabelecimentos comerciais, pioneiros nesta artimanha, têm uma máquina que difunde aromas sugestivos na ânsia de fazer aumentar as vendas! Ao passar defronte de uma loja que vende chocolate é-nos extremamente difícil não entrarmos para nos abastecermos convenientemente! Mas, nem tudo são rosas!… O mundo que conhecemos hoje, apesar do fumo dos escapes dos automóveis e das fábricas, é praticamente isento de cheiros, ainda que pensemos o contrário porque, de facto, todos os dias somos bombardeados com protestos e chamadas de atenção para a crescente poluição da atmosfera e o  alargamento cada vez maior do buraco do ozono! Contudo e não obstante a verdade contida nesta premissa, o ar já conheceu dias piores no que consta a odores, pelo menos a meu ver!… Durante o Renascimento era costume, nas cidades, deitar para a rua todo o lixo que é possível: Víscera de animais, cães e gatos mortos, restos de comida, excremento de origem humana e animal e até, pasme-se, restos de sangue dos cirurgiões. Tudo isto acumulado pelas ruas dava origem a uma lama putrefacta que exalava um cheiro nauseabundo. Este estado de coisas só foi alterado quando se verificou que, esta podridão dava origem a doenças! E por falar em doenças, já aconteceu ser diagnosticado cancro a pessoas, cuja descoberta se deve ao estranho comportamento dos seus próprios cães que, não paravam de cheirar a zona infectada ao ponto de intrigarem os seus donos, facto que os levaria, finalmente, ao médico! Espero não perder, nunca, o meu sentido do olfacto! Como poderia, então, sentir em mim o aroma da poção milagrosa e rejuvenescedora?

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