A Última Estação

Publicado por: Milu  :  Categoria: A Última Estação, LIVROS

A última estação

A Última Estação

De

Jay Parini

Jay Parini
Jay Parini

Jay Parini nascido em Scranton na Pensilvânia é professor de Inglês e Escrita Criativa na Middlebury College em Vermont, nos Estados Unidos da América. Poeta e biógrafo escreveu 5 livros de poesia, seis romances e três biografias, entre os quais: “A Travessia de Benjamim”, “A Arte de Ensinar”, e as biografias de William Faulkner e John Steinbecke. A obra Theodore Roethke: An American Romantic foi nomeada para o Prémio Pulitzer.

Barra monocromatica

«Todos pensam em mudar o mundo, mas ninguém pensa em mudar a si mesmo.»

Liev Tolstói

O livro “ A Última Estação” da autoria de Jay Parini é uma obra magnífica, que nos embriaga de emoção com o relato do último ano da vida de Liev Tolstói, aquele que foi um dos maiores ícones da literatura russa do século XIX, que gostava particularmente de ser tratado por Lev Nikoláievitch.

Jay Parini, o autor deste brilhante romance histórico, adverte-nos no seu Epílogo, que esta é uma obra de ficção, ainda que se tivesse socorrido das memórias contidas nos diários pertencentes a membros do impressionantemente amplo círculo tolstiano, incluindo a família e o próprio Lev Tolstói, que, no seu conjunto, lhe permitiram formar uma imagem de como terão decorrido os acontecimentos, e abeirar-se tão próximo quanto possível do verdadeiro cenário, que foi palco do dramático e último  ano de vida de Liev Tolstói, o homem mais conhecido na Rússia e admirado em todo o mundo, pelo seu talento e genialidade. Durante a  sua juventude, Liev teve o comportamento próprio daqueles que pretendem  tudo viver num só dia. Bebia demasiado, perdeu fortunas ao jogo e envolveu-se em intricadas e tórridas aventuras com jovens mulheres, conduta que mais tarde, numa idade já menos jovem, lhe granjeou um pesado arrependimento tornando-o vítima de atormentados e sucessivos pesadelos, que lhe perturbavam o sono e tanto lhe inquietavam a consciência.

L.N.Tolstoy_Prokudin-Gorsky

Liev Tolstói

Com a passagem dos anos, Liev havia-se tornado num novo homem! Tomado por profundos sentimentos de fraternidade ansiava ascender a Cristo, aquele que considerava “O homem que melhor soube exprimir uma conduta moral que gerasse justiça, felicidade e elevasse espiritualmente a todos os homens”. Assim sendo, se pretendia seguir os mandamentos de Cristo, como poderia, então, viver com a sua família na mais terrível contradição, permanecendo imerso na riqueza e no luxo? Oriundo de família nobre e abastada,  num acesso de despojamento, virá a renegar o título de Conde e a doar os direitos autorais dos livros que viria a escrever, decidido a viver uma vida simples e em comunhão com natureza, a exemplo dos camponeses que viviam junto à sua propriedade e que chegou a acompanhar no trabalho da terra, com bastante alegria e satisfação. Porém, a esposa, Sónia Andréevna, habituada a uma vida faustosa, não estava pelos ajustes, e como tal, deu início a uma luta sem tréguas, acusando-o de querer deixar a família na miséria. Disposta a travar as intenções do marido, tudo tentou para melhor conseguir os seus intentos, inclusive a chantagem emocional ao encenar uma tentativa de suicídio, evidenciando na contenda o seu mau feitio, próprio de um carácter a roçar o doentio.

Chegado ao limite da paciência e profundamente incomodado com a conduta da mulher que tanto amava, mas cuja ambição a havia tornado numa megera, Liev decide abandonar Iássnaia Poliána, a morada de família, e parte numa desesperada busca pelo natural, rumo a um destino que preconizou como o lugar ideal para realizar o sonho que o perseguia – viver em paz e na maior das simplicidades. Todavia, o imprevisto reservou-lhe outros desígnios. A meio da viagem Liev adoeceu, provavelmente devidos aos transtornos causados pelas desconfortáveis carruagens de terceira classe, onde não faltavam as traiçoeiras correntes de ar. É no seu leito de morte, num quarto da humilde casa do chefe da estação ferroviária, que nos é dado assistir aos derradeiros dias de vida deste grande e bondoso homem, que tanto defendeu e promoveu o sentimento da fraternidade entre os homens, sem contudo, crer em Deus, tal como nos é apresentado pela igreja. Liev opunha-se veementemente à acção dos governos, da igreja e dos seus dogmas que nos impõem um Deus castigador, acusando-os de quererem submeter o povo incutindo-lhes o temor pelos castigos divinos. Afirmava que de Deus nada sabemos, a não ser que Ele “é o início de todas as coisas, a condição essencial da nossa existência e um pouco daquilo que consideramos ser vida dentro de nós”. A igreja, fazendo o papel de redentora, bem tentou aproximar-se do moribundo, suplicando para que se arrependesse, mas os seguidores de Tolstói foram irredutíveis na decisão de impedir que tal acontecesse.  Ainda estava bem fresco nas suas memórias, um caso que havia acontecido há nove anos, em que Liev quase morrera, à pergunta que lhe havia sido feita, se queria receber o padre, respondera: “Será que não conseguem compreender que, mesmo no leito de morte, dois mais dois são quatro“?!

No dia 20 de Novembro do ano de 1910 Liev Nikoláevitch Tolstói sucumbiu à pneumonia, transpondo o ténue véu que o separava da Eternidade.

Estação

23 Comentarios to “A Última Estação”

  1. mfc Diz:

    O romance da vida de um romancista…

  2. Milu Diz:

    mfc

    Nem mais! Bastante interessante esta história de vida. Ah, como eu gosto de gente assim, especial, tão diferente de todos , melhor dizendo, do comum! Só por isso, e só por isso, foi capaz de aturar aquela mulher, mas a verdade é que eles se amavam! Não fosse a “pancada” dela e a vida deste casal teria sido um verdadeiro idílio!

  3. José Pinto Diz:

    É uma história fascinante.
    Ao ler o texto, lembrei-me que “desapego dos bens terrenos”, “vai, dá tudo o que tens aos pobres e, depois, segue-me” são expressões muito caras à Igreja Católica, tendo como fonte o Novo Testamento da Bíblia. O problema foi a história faustosa que desacreditou a mesma Igreja na Idade Média, para já não falar do Tribunal do Santo Ofício (Inquisição). Bem pregava Frei Tomás!
    O percurso de Tolstoi na terra dos Czares trouxe-me à lembrança a história recente daquele empresário português que, em fim de carreira, desatou a oferecer um automóvel a cada empregado. Os familiares entraram em parafuso, recordam-se? O homem não devia estar bom da cabeça, pensaram eles!
    Há quem diga que os mais pobres são os que melhor dormem. Acredito que há momentos na vida em que todos desejamos uma vida de eremita!
    Beijo

  4. antónio Diz:

    Milu

    Antes de mais, quero deixar aqui o meu agradecimento sincero pelas várias notas que me tem deixado no meu blogue. E qual a minha resposta? Tenho andado muito desorganizado na gestão do meu tempo. Sinto-o o fugir, quero fazer tudo ao mesmo tempo…
    Tenho a impressão que terei que terei que parar na próxima estação e deixar-me ficar sentado num banco a ver passar os comboios, aproveitar para reflectir.
    Que fazer do resto dos meus dias?!…

    Texto muito bem elaborado. Imagino o trabalho, a concentração e, acima de tudo, está à vista o mérito da ensaísta/escritora que está subjacente
    à qualidade destas excelentes crónicas/ensaios.

    Beijinho muito amigo
    António

  5. Milu Diz:

    Olá José Pinto.

    Sempre que leio seja o que for sobre a Inquisição fico muito confusa. Custa-me a entender como se pode pregar uma coisa e fazer exactamente o contrário. Penso que, se a igreja ainda tem tantos crentes, deve-se ao facto de muitos deles nem sequer saberem o que foi a Inquisição, ou, se sabem, não conhecem os pormenores. E quem diz a Inquisição diz outras coisas. É evidente que aquela igreja nada tinha a ver com Deus, porque se tivesse, como haveria, então, de ser o diabo? Também me faz pensar sobre o ser humano e tudo aquilo de que é capaz. Até o Papa Bento XVI faz a apologia do sofrimento, como se ele soubesse o que isso é. Mesmo assim vai dando algum jeito, espero que no final do ano, aquando da sua já anunciada visita a Portugal, seja amnistiada de uma multa de trânsito, que tive há cerca de um ano! Julgo não ter espírito de eremita, porque gosto de comunicar e gosto de estar com pessoas, mas não todas! Isso também é verdade! Na minha vida conheci pelo menos uma pessoa totalmente abnegada, dava até ficar quase sem nada, mas também conheci o contrário. Um dia destes faço um post onde contarei algumas situações a esse respeito. Por vezes até acho engraçado, quem houvera de dizer, que as minhas “desventuras” de criança, viriam um dia parar à Internet, logo a circular por todo o mundo?! 😀

  6. Milu Diz:

    Olá António.
    Não tens de agradecer, há uns sítios por onde gosto de passar e se calhar deixo um comentário, mas faço-o por gosto e principalmente quando sinto que tenho algo a dizer. E o dispersamente é um desses sítios, que gosto de visitar. Então, ainda por cima vivemos tão perto!
    Senti-te triste, mas momentos desses todos nós temos. Estou aqui a falar alto, tal como se costuma dizer, mas a verdade é que estou com um problema que me anda a atormentar,e, por isso, não estou nos meus melhores dias. Por outro lado, esforço-me por manter a calma e prometer a mim mesma só deixar-me abater com os problemas verdadeiramente sérios, e o que me chateia, pode vir a não ser assim tão dramático. Já vou tendo alguma experiência. Às vezes a vida descamba-nos para o lado que menos esperávamos.
    As melhoras para a tua mãe.
    Um beijinho.

  7. Zé do Cão Diz:

    Quando li “Mudança de Estação”. Pensei assim. Finalmente alguém se lembrou do meu canto, no Concelho onde nasci. Na capital do Concelho, havia uma estação de comboio. Levava trabalhadores para a capital do Concelho vizinho e tinha a particularidade de ter mais carruagens “J” do que as de passageiros. O certo é que iam sempre cheias, mais estas do que aquelas. Tratamento especial dado aos trabalhadores. De repente o comboio foi abatido e não querem ver que o sitio virou estação marítima.
    Daí o meu pensamento.
    Milu, problemas , problemas…pode ser que não seja nada e tudo volte à normalidade…Rezo por isso (à minha maneira, claro).
    Já agora uma achega…sobre o comentário de J. Pinto. O tal empresário ao que parece estava teso que nem um carapau…e os familiares também pensavam que o dinheiro abundava por todos os lados. “li sobre o assunto”.

    Beijocas

  8. CBO Diz:

    deixei um comentário há dias, mais abaixo, mas não deve ter entrado e na altura não me aercebi disso.
    Queria agradecer-lhe as visitas e comentários lá no Rchedo mas, acima de tudo,agradeçoa a oportunidade que me deu de conhecer o seu magnífico blog.
    Vou passando por aqui

  9. Milu Diz:

    Olá Zé!
    Não é Mudança de Estação,é A Última Estação! 😀
    Olha que eu tive de ir ver ao Google o que eram carruagens “J”. Em toda a minha vida só fiz 3 viagens de comboio e nem me lembro praticamente de nada. Fiquei com a ideia que são vagões mas de mercadorias. Se eram aí que viajavam os trabalhadores, então, viajavam de borla, só podia ser, porque não podia haver bilhetes para viajarem pessoas naquelas carruagens ou vagões. Se assim era, então percebe-se porque iam sempre cheios! 😀
    O problema a que me referi num dos comentários anteriores não é nada de cuidados, contudo, é uma situação que me irrita, porque a sua resolução não depende só de mim, por isso se arrasta há algum tempo.
    Tenho apenas uma vaga ideia do caso que contou o J:Pinto, não me recordo de pormenores, mas gostava de ter um patrão assim!
    Um beijinho.

  10. Milu Diz:

    Olá CBO

    Há por aqui algures um comentário seu, lembro-me de o receber e de o aprovar, só não sei se se refere a esse ou a um outro posterior, que terá pensado que enviou. Muito obrigada pelo elogio ao meu blog. Também gosto de visitar o seu e aprecio muito a espontaneidade que nele está patente. 😀

  11. lilás Diz:

    E como eu gosto destas passagens por aqui, há sempre uma surpresa á minha espera! obrigada Milu
    Bjs

  12. Zé do cão Diz:

    Milu.
    As carruagens “J” dos comboios, são as que transportam os animais vivos.
    Alguns coitados iam mais mortos que vivos. Sempre que se queria ofender alguém, sempre se dizia.
    Vais viajar no “J”. E tinham que pagar o mesmo que os outros, só tinham a vantagem de, para subir ou descer arriavam uma prancha, e era um vagão sem telhado. Enfim… “gado”. à boa maneira portuguesa.
    Beijocas

  13. Milu Diz:

    Olá Lilás.
    Gostava de postar mais frequentemente, mas nem sempre tenho tempo. Também já me aconteceu ter disponibilidade mas, em contrapartida, faltar-me a disposição para escrever e em vez disso ando por aqui a ler os blogs! 😉
    Um bom fim-de-semana e um beijinho grande.

  14. flordeliz(florbytes) Diz:

    Acabei de falar alto e espero que quem partilha neste momento o mesmo espaço oiça: se encontrares o livro “a última estação”…compras-mo?!
    Só espero que seja “atempadamente” até porque fiquei curiosa e, mulher curiosa é do pior de se aguentar 🙂
    Parabéns
    E um fim de-semana tranquilo.

  15. Milu Diz:

    Olá Zé

    Pois olha, nunca tal me passaria pela ideia. Pessoas a viajar com animais e ainda por cima a pagar bilhete! Mesmo sem tecto devia ser grande o cheirete e se chovesse ficavam todos encharcados. As minhas viagens foram bem confortáveis se vistas bem as coisas, mas nem me perguntes que carruagens eram, nem porque entrei naquela e não noutra, de primeira não era de certeza, não vi nada de especial, recordo-me apenas que numa das vezes fui sentada defronte a um par de senhores, dos quais um parecia ser bem abonado de haveres. Durante toda a viagem fui encantada com a eloquência das conversas dele. Era viúvo e tinha mais de sessenta anos, parece que os filhos tinham a intenção de o casar com a empregada doméstica, uma senhora, que por sua vez tinha trinta anos, que conheciam bem e que tinham como séria e honesta, logo confiável. Pois foi toda a viagem a tecer considerações sobre as razões que achava pertinentes para não fazer a vontade aos filhos, isto é, não casar com a empregada. Durante toda a viagem fui a ouvi-lo encantada!
    Um beijinho

  16. oliver pickwick Diz:

    Entre as modalidades do romance, o histórico é o meu preferido. É um grande desafio, inventar uma história num universos de personagens e fatos reais. A sua resenha aguçou a minha curiosidade, além disso, Tolstói é um dos meus clássicos universais favoritos. Este eu vou ler.
    Um beijo!

  17. Milu Diz:

    Olá Flordeliz!

    Não deixas cair nenhuma! Acerca do livro vale mesmo a pena lê-lo. Não me recordo sequer qual é a editora que o publicou, acontece que os livros que vou lendo ou são emprestados por amigos ou vou buscá-los à Biblioteca Municipal. Em tempos ainda cheguei a comprar bastantes livros, alguns bem caros devido às encadernações luxuosas, mas, depois de os ler, só me estorvam! Esta não parece ser uma atitude muito própria de quem é e sempre foi uma amante da leitura, mas o certo é que isto é mesmo verdade. Por norma não leio o mesmo livro duas vezes, mas talvez ainda o chegue a fazer com determinados livros, acresce para isso o facto, de querer falar aqui sobre eles. Têm uma mensagem demasiado importante, por isso interessa-me relê-los. Espero fazê-lo atempadamente! 😀
    Um bom fim-de-semana.
    Um beijinho.

  18. Milu Diz:

    Olá Olivier!

    Também gosto muito de ler livros históricos e porquê? Porque me apaixona aprofundar os conhecimentos sobre a espécie humana, afinal, sobre aquilo que somos. Determinados acontecimentos históricos que põem a nu as motivações humanas dão-me que pensar. São muitas as vezes que constato que o ser humano, apesar de saber, que um dia vai morrer, age como se fosse imortal, como se a sua permanência na terra fosse eterna! Claro que se pode ser imortal, isto é, a nossa memória permanecer viva no consciente colectivo, mas não é isso que quero expressar.
    Um beijinho.

  19. opolidor Diz:

    Tambem este se junta a muitos outros escritores russos que sempre admirei, desde cedo…
    beijo

  20. Milu Diz:

    Olá opolidor!

    Há livros que nunca se esquecem. Lembro-me que na minha juventude li muitos bons autores, mas nessa altura não estava preparada para entender as suas mensagens, nem podia. Na vida tudo tem um momento certo, até para sentir e perceber melhor as circunstâncias que nos rodeiam. Um beijinho.

  21. milu duarte Diz:

    Adorei seu blog. Coincidência, nós duas milus e achei as fotos de sua biblioteca parecidas com a minha. Ambas com amor pela leitura. Este espaço vou visitar sempre, com certeza. Um abraço da Milu do Brasil à Miilu de Portugal.

  22. A Última Estação (The Last Station. 2009) « Cinema é a minha praia! Diz:

    […] estação final… Até as locações, são puro romantismo. Lindas! Me fez querer ler o Livro, de Jay Parini, o qual o filme foi baseado. O filme é longo. Merece ser visto sem pressa. Ele até […]

  23. LELLA Diz:

    Oi Milu!

    Escrevi sobre o filme baseado nesse livro. Ao ir atrás de foto do livro, cheguei aqui. Gostei! Então linkei essa sua página no meu artigo.

    Se não aprovar, me avise que eu retiro.

    Beijos,

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