O Elogio do fracasso

Publicado por: Milu  :  Categoria: O Elogio do Fracasso

O Elogio do fracasso
De
João Teixeira Freire

José Teixeira Freire nasceu em Lisboa no ano de 1982. É licenciado em Direito e exerce a actividade de jornalista, como colaborador, em diversas publicações universitárias. O Elogio do fracasso é o seu primeiro romance.

Este livro tem desde o início, uma peculiar riqueza linguística, nomeadamente, no que diz respeito à abundância de recursos estilísticos, que vai progressivamente diminuindo ao longo da narrativa para dar lugar a uma intensa profusão de ideias de teor filosófico e de valores que regem a vida do ser humano.
O Elogio do fracasso reflecte o estado de espírito dos jovens da actual geração que, em dada altura das suas vidas, decidem pôr em causa as regras e valores socioeconómicos vigentes, atitude que os projecta numa crise existencial, criando neles a necessidade premente de vivenciar novas experiências. A narrativa está dividida em três partes, cada uma delas tem a sua própria personagem principal, representando estas, estilos e concepções de vida diferentes. Francisco é um jovem estagiário de Direito que sente repugnância ao imaginar o seu provável destino, se continuar a seguir o caminho que traçou até ao momento presente, ser um advogado bem sucedido, ter uma boa casa, um automóvel topo de gama, uma mulher e filhos, férias e toda uma  panóplia de abundâncias supérfluas. E, como tudo isto, não cai do céu, não lhe restará outra hipótese que não seja a de trabalhar muito e cada vez mais, como um danado, para auferir os rendimentos necessários à satisfação dos compromissos adquiridos nos seus ímpetos consumistas, numa total rendição ao sentimento materialista tão característico dos nossos dias. Ocorre-lhe frequentemente a ideia que, talvez fosse bem melhor, ter uma vida simples e, por isso mesmo, livre e despreocupada. No fundo o ser humano precisa de tão pouco para viver!… Francisco sabe, que apesar de toda esta evidência, todos terminam mesmo por fazer o que a sociedade espera que façam, ou seja, encetam uma vida igual a tantas “marinando” num aperto financeiro constante com o sustento da família, numa senda de consumismo desbragado, buscando, afinal, uma felicidade paradoxal.
Miguel, um seu amigo, mostrou ser mais corajoso, decidiu viver no fio da navalha, desistiu dos estudos e foi para Paris, tem alma de artista, pinta umas telas e sonha ver o seu talento reconhecido. Entregou-se à aventura que a cidade luz tão prodigamente lhe proporciona! Vive num bairro de iguais, onde todos são um pouco como ele… sem eira nem beira!…
Quanto a Nadina, amiga de Miguel representa, inequivocamente o protótipo de menina, filha de família, que nunca precisou fazer nada na vida. Vive ao sabor do acaso coleccionando namorados, que só não lhe agradam porque não sabe o que quer. Pensa que é especial mas não tem perspicácia para vislumbrar o que é óbvio demais: Gosta demasiado de ganzas! Foi o que me pareceu!
Faria, um outro amigo, foi quem mais se aproximou do que pode ser considerado uma forma de vida plena de sentido. Formou-se em medicina veterinária e rumou em direcção ao Alentejo, onde se estabeleceu numa pequena quinta. É casado com Sandra da qual tem uma filhota, arrasta-se numa 4L branca a cair de madura e coberta de poeira vermelha. Gosta muito da sua profissão, sendo que, deixa tudo para trás para acudir aos seus “pacientes”! Apesar da sua responsabilidade e sentido do dever não deixa de ter, disfarçada, algures na sua quinta, uma pequena plantação de uma ervinha que faz rir… Digo eu! A satisfação e bem-estar estão patentes nesta família, apesar, do seu modo de vida despojado.

Não posso deixar de aproveitar esta oportunidade para tecer algumas considerações, sobre a questão do consumismo, que julgo serem pertinentes. Considera-se que o consumismo ou acto de comprar seja uma forma de buscarmos felicidade ainda que fugaz, deste modo, o consumismo, além de estar aliado a um sentimento materialista é hedonista. Actualmente há quem defenda que o consumismo deve ser visto através de outro prisma, isto é, comprar pode ser um acto de auto-renovação, um desejo de mudança, novas roupas, novas mobílias, etc. Importa, acima de tudo, não ser sempre o mesmo. A verdade é que se for feito o exercício de recuar no tempo, verificamos que, antigamente, as pessoas e as suas respectivas casas, principalmente os interiores, permaneciam inalteradas apesar da passagem dos anos. Fosse porque o dinheiro não abundava ou porque a oferta de artigos fosse menor, o facto é que este cenário sugere uma certa estagnação. As roupas eram guardadas em armários, protegidas da traça pela secular naftalina, duravam assim conservadas, anos infindos. Os sapatos iam e vinham do sapateiro bastas vezes, desde capas a sobre capas e protectores de aço, tudo servia para prolongar a já tão vetusta vida. Não tenho saudades dessa miséria e muito menos da ignorância que então grassava! Gosto de viver o momento actual! Consumista e renovadora… Pois então!