Droga – A Cultura do Ópio

Publicado por: Milu  :  Categoria: Droga - A Cultura..., SOCIEDADE

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Nem sempre as Drogas foram Drogas. Ora vejamos:

“Desde a antiguidade até ao momento da supremacia da sociedade capitalista – quando esta entra em contacto com os povos dos cinco continentes – a coca, o pavot e o cannabis não eram mercadorias. As agora chamadas drogas eram instrumentos culturais que faziam parte de um acervo social que tinha o seu próprio equilíbrio, assim como normas de uso e controlo das “plantas sagradas”. As relações capitalistas introduzem a sua produção e venda como mercadorias.

A actual “guerra das drogas” enquadra-se na luta permanente, e hoje em dia feroz, pelo domínio do mercado mundial que, neste campo, distingue entre as drogas do Sul e as drogas do Norte. Tem os seus antecedentes nas “guerras do ópio”, continua com o proibicionismo americano dos começos do século e inicia esta fase actual com a Convenção Única sobre Estupefacientes de 1961.

As “guerras do ópio” foram um acontecimento histórico que assinalou a passagem à fase contemporânea e moderna na apropriação, no uso e na aplicação das drogas. Esse momento histórico correspondeu à hegemonia de um novo tipo de sociedade baseado em processos diferentes, mas simultâneos e convergentes, a que Hobsbawn chamou as “duas revoluções”: a antifeudal e a industrial.”

As consequências da revolução antifeudal:

“A revolução antifeudal significou a libertação dos servos da gleba. Ao serem declarados “livres”, deixaram de estar adstritos à terra e deixaram também de possuir os meios de subsistência que esta lhes proporcionava. Foi assim que se transformaram em trabalhadores assalariados, quer dizer, passaram a trabalhar na recente indústria de manufactura em troca de um salário em dinheiro que lhes permitia comprar os elementos de sobrevivência. No início do processo chamado “revolução industrial”, em meados do século XVIII, e durante quase um século, a jornada de trabalho era extenuante e durava até 18 horas por dia: ao mesmo tempo, os que batiam às portas das fábricas à procura de trabalho eram tantos que, os que o encontravam, faziam-no por um salário de miséria.

(…).

Nestas condições, a administração e o comércio de drogas com carácter medicinal, mas baseadas no ópio, eram uma prática consciente e premeditada (Bachman e Coppel, op.cit.,cap.2). Esta prática tinha como objetivos: primeiro, manter os indivíduos deprimidos, pois eram potencialmente perigosos se se revoltassem contra a sua situação, da qual iam tomando paulatinamente consciência; segundo, substituir os alimentos e o álcool. 

A “guerra do ópio”:

(…)

Em 1557, os portugueses estabeleceram-se em Macau e, em 1569, os espanhóis nas Filipinas. A partir daí, ambos tentaram comercializar as especiarias, as sedas e as pedras preciosas com a China; mas ainda não tinham nada a oferecer que fosse interessante para esse povo, excepto o tabaco americano. Assim, foram introduzindo na China, o hábito de fumar com cachimbo. (…).

Durante o século XVII, os holandeses expulsaram os espanhóis e os portugueses de Ceilão, da Formosa (Taiwan), das Índias Orientais (Tailândia, Cambodja, Laos, Vietname) e de outros territórios. As colónias chinesas da Formosa e das Índias Orientais tinham, como passatempo, o hábito de fumar tabaco em cachimbo; os holandeses então misturaram ópio produzido na Índia ao tabaco que vendiam para os cachimbos dos chineses. Por este motivo, o imperador da China permitiu aos holandeses, e só a eles, estabelecer relações comerciais com o seu país, se bem que só no porto de Cantão. No entanto, em 1729, também proibiu os fumadores de ópio.

(…).

Apesar de tudo, entre 1811 e 1821 foram vendidas na China 340 toneladas de ópio como média anual, provenientes da Índia; na década seguinte, a média anual aumentou para 1841 toneladas, de maneira que no fim dos anos 30 já havia dois milhões de adeptos no país. A situação era insustentável para a China, que pagava com chá e seda a droga, nem desejada nem saudável, que drenava a sua riqueza e embrutecia a população. Por conseguinte, o imperador teve que actuar.

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Como Cantão era o único porto autorizado a comerciar com estrangeiros no país e, supostamente, era a entrada legal do ópio, em Dezembro de 1838 foram expulsos os comerciantes da cidade, na sua maioria ingleses, queimadas 2000 toneladas de ópio num mês e… estipuladas condições e prazos para que os viciados nacionais deixassem paulatinamente de o fumar. A Inglaterra reagiu em nome da “liberdade do comércio” e, em 1840, os seus barcos de guerra iniciaram um conflito armado para a impor.

Sem condições técnicas para combater estas tecnologias de suporte bélico, a China viu-se obrigada a assinar, em 1842, o Tratado de Nanking, segundo o qual seriam pagas indemnizações ao governo e aos comerciantes ingleses, num total de 21 milhões de dólares, para além de se abrirem outros portos ao comércio internacional e ser cedida à Inglaterra a ilha rochosa de Hong Kong. Uma nova guerra do ópio, entre 1856 e 1858, permitiu legalizar definitivamente a sua importação, em troca de pagamento de tarifas alfandegárias.

Como consequência da legalização do ópio e do aumento do preço imposto pelos tributos à importação, em 1860 este comércio passou a ser substituído por plantações próprias de papoilas nas províncias fronteiriças da China com a Índia. O ponto máximo das importações foi em 1880, com 6500 toneladas, ao passo que a produção interna cresceu até às 22 ooo toneladas nos finais do século. O país chegou a ser o primeiro produtor mundial, destronando o monopólio inglês. Com quinze milhões de fumadores nos princípios deste século, transformou-se também no primeiro consumidor. Foi assim que os emigrantes chineses na costa oeste dos Estados Unidos – importados como mão de obra para as companhias que construíam a linha de caminho de ferro que unia o Atlântico ao Pacífico – introduziram neste país, nos fins do século passado (XIX), as casas para fumadores de ópio.

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Excertos em itálico da autoria de René Tapia Ormazábal

Bibliografia 

ORMAZÁBAL, T. René. (1999). Mamã Coca, Coca-Cola, Cocaína: Três Pessoas Numa Droga Só. Notas para um ensaio sobre a economia política do narcotráfico. Caminho. Lisboa. p. 95-100.