A construção do génio

Publicado por: Milu  :  Categoria: A construção do génio, CIÊNCIA

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“O único lugar onde o sucesso vem antes do trabalho é no dicionário.”

Albert Einstein

Serve este resumo do livro intitulado Einstein, da autoria de Peter D. Smith, para lançar alguma luz sobre o que foi, na realidade, o génio que fez história. E já que falei em génio, é imperioso que se esclareça, que génios podemos ser todos nós. Basta que para tal encetemos uma luta sem tréguas rumo a um objectivo definido. E, quem ousar discordar, leia este livro, se fizer favor. Se achar que ler o livro lhe irá ocupar demasiado tempo, tem aqui a solução – faça o obséquio de ler este post!

Bem mais curto, mas assertivo. Nele está o essencial, para o ajudar a compreender, que o génio, a  genialidade, não vem do nada, mas sim de muito e árduo trabalho!!

Agora vem a segunda parte – para os professores e educadores: Quando no exercício da vossa profissão vislumbrarem um aluno com cara de parvo, ou vos parecer parvo, atentem com devoção. Para os rebeldes tenham o mesmo procedimento. Dentro deles há uma vontade. Descubram-na! E esse será verdadeiramente o vosso mérito! Porque o resto, decorar matérias, é mérito do aluno.

Mais uma vez sublinho, como vem sendo hábito, que o conteúdo entre parêntesis rectos é da minha autoria. Tudo o resto foi retirado do livro.

♣♣♣

“Albert Einstein nasceu em Ulm, uma cidade do Sul da Alemanha, a 14 de Março de 1879.”
(…)

Sem Título

“Einstein nunca se apresentou como matemático. O físico que escreveu a mais famosa equação científica, E=mc², um dia tranquilizou uma aluna, dizendo-lhe: Não fique preocupada por ter dificuldades em matemática; garanto-lhe que eu tenho ainda mais” (p. 8).

“Rudolf Kayser , enteado por afinidade de Einstein, descreveu numa biografia da sua autoria a «atmosfera próspera e burguesa» do lar do Einstein. Einstein, quando adulto, rejeitava aquilo que considerava ser os valores materialistas dos pais, mas o ambiente em que cresceu estava sem dúvida repleto de estímulos – a música, a literatura e a ciência eram presenças constantes: a mãe era uma pianista talentosa e a música tornar-se-ia um dos grandes prazeres da sua vida. O pai lia frequentemente em família os poemas de Heinrich Heine (1797-1856), pelo que o poeta alemão sempre foi um dos preferidos de Einstein. Jakob procurava constantemente estimular o interesse do sobrinho pelas maravilhas das mais recentes tecnologias e desempenhou um papel fundamental ao incentivar Einstein a estudar Física e Matemática.”

[Estímulos, portanto]

“De facto, durante toda a vida, Einstein sempre gostou de aplicar os conhecimentos científicos a problemas práticos. Em 1908, inventou um instrumento para medir voltagens extremamente baixas (inferiores a 0,0005 volts) que mais tarde viria a patentear.
Na década de 20, trabalhou com o físico húngaro Leo Szilard (1898-1964) com o intuito de desenvolverem uma bomba inovadora para frigoríficos domésticos. Esta capacidade inventiva deve-se em grande parte ao seu tio Jackob, e a ciência da electricidade viria a desempenhar um papel de grande relevo na vida privada e profissional de Einstein.”
“Carl Seelig, um dos primeiros biógrafos de Einstein, perguntou-lhe um dia se ele tinha herdado do pai ou da mãe o talento para a ciência. A resposta de Einstein foi peremptória: “Não tenho nenhum talento em particular, sou apenas extremamente curioso. Por isso, penso que essa questão da hereditariedade é dispensável”. Como ele próprio dizia, foi curiosidade, obsessão e pura perseverança que me conduziram aos meus raciocínios, não a hereditariedade nem a educação.”

“Acabou por ser persuadido a escrever uma breve história da sua vida em 1946, mas trata-se de uma autobiografia demasiado intelectual que diz muito pouco do homem por trás do cientista. Como se para desencorajar possíveis biólogos, declarou que o que é essencial na vida de um homem como eu é o que ele pensa e o modo como pensa, não o que ele faz ou sofre.”
“Einsten diz ter desejado desde tenra idade libertar-se das correntes do «meramente pessoal», de uma existência dominada por desejos, esperanças e sentimentos primitivos. A objectividade do conhecimento científico ofereceu-lhe esta liberdade, mas a fuga do meramente pessoal é como uma linha vermelha a sublinhar a vida de Einstein. A sua dedicação à ciência gerou nele um sentimento de isolamento que o levou a dizer um dia: Nunca pertenci de corpo e alma a um país, a um estado ou a um círculo de amigos; nem mesmo à minha própria família.”

“Einstein era uma criança calada, sonhadora e introvertida. Não era certamente um menino prodígio, ou Wunderkind, e a certa altura os seus pais, receando que aquele filho «patologicamente modesto» tivesse dificuldades de aprendizagem, chegaram mesmo a consultar um médico. (…). Maja, mais nova do que Einstein e sua única irmã, recorda que, mesmo em criança, sempre que lhe faziam uma pergunta o irmão repetia-a para si próprio «mexendo levemente os lábios». Para a criada era sinal de estupidez, mas para Maja, que era mais complacente, era sinal de «profundidade na forma de pensar». Einstein atribuía mesmo o seu discernimento científico ao seu lento desenvolvimento, facto que sem dúvida tranquilizará muitos pais” (pp. 15-17).

“Quando fez cinco anos, os pais de Einstein contrataram-lhe uma preceptora. Infelizmente, ela provocou na criança um dos seus famigerados ataques de mau-génio, durante o qual ele «agarrou numa cadeira e a atirou contra a professora, que fugiu aterrorizada e nunca mais ninguém a viu». Também Maja foi vítima de tais assomos e uma vez Einstein tentou «abrir-lhe um buraco na cabeça» com uma enxada de brincar.” (…).

[Rebelde, portanto]

“Einstein começou muito cedo a ter aulas de violino, que se prolongaram até aos 14 anos. A princípio, a prática repetitiva e interminável não lhe agradava nada, mas por fim a música tornou-se uma parte fundamental da sua vida. Mais tarde, escreveu que só depois de se ter apaixonado pelas serenatas de Mozart, aos 13 anos, começara verdadeiramente a compreender e a apreciar a música. Acrescentou ainda que o amor é melhor professor do que o dever. Para Einstein, esta era sem dúvida uma verdade irrefutável, pois detestava as abordagens mecânicas à educação” (p. 18).

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“Einstein entrou para a escola primária no Outono de 1885. A Petersschule era uma grande escola católica romana. Tinha quase 2000 alunos e ficava situada na Blumenstrasse, próximo de sua casa. Das 70 crianças da turma de Einstein, ele era o único judeu. Durante uma das aulas de religião, o professor mostrou um prego e disse que «os judeus pregaram Cristo na cruz com pregos como este». Einstein passou também a ser, por esta altura, vítima de insultos racistas: As agressões e os insultos no percurso entre a casa e a escola eram frequentes, mas geralmente não eram demasiado violentos. No entanto, eram o suficiente para sedimentar, mesmo numa criança, um sentimento vivo de se ser um intruso. Este rapaz sossegado, que nunca gostou de desporto nem de participar nas brincadeiras das outras crianças, não era popular e cedo foi apelidado de Biedermeier («marrão» ou «totó»). (…) cedo se tornou «o melhor da turma e tem um boletim escolar brilhante», como disse orgulhosamente a mãe à própria irmã.”

[Já naquele tempo havia Vítimas de Bullying, portanto]

“Einstein entrou aos nove anos e meio no prestigiado Luitpold Gymnasium de Munique, um liceu que oferecia aos alunos um currículo clássico de que faziam parte o Latim e o Grego. De acordo com o historiador científico Lewis Pyenson, era pouco usual «o filho de um industrial» frequentar o «elitista e dispendioso Luitpold Gymnasium». Uma fotografia da turma de Einstein tirada em 1889 mostra o jovem na fila da frente, no terceiro lugar a contar da direita. É o único da turma que exibe um sorriso rasgado. Mas as aparências são frequentemente ilusórias, como as teorias de Einstein viriam a defender mais tarde. Ele não se sentia de todo feliz no Gymnasium: Os professores da primária pareciam sargentos instrutores, comentou mais tarde, e os professores do Gymnasium pareciam-me tenentes. Einstein opôs-se pela vida fora a todos os métodos educativos baseados na disciplina, na autoridade externa e na ambição. Não era o único. Uma nova geração de escritores, entre eles Hesse e Thomas Mann, viria a criticar a educação severa e regimental praticada na Alemanha” (pp. 19-21).

“Durante mais ou menos um ano, depois de ter começado a frequentar o Luitpold Gymnasium, Einstein entregou-se à fé judaica com um fervor que deve ter preocupado os pais. Segundo as suas próprias palavras, ele era filho de pais (judeus) completamente não praticantes. Hermann e Pauline eram judeus assimilados e liberais: não celebravam os rituais hebraicos (…). No entanto, enquanto frequentou o Luitpold, o jovem Einstein recebeu formação no Judaísmo o que, segundo Maja, «despertou nele um profundo sentimento religioso». Deixou de comer carne de porco e até compôs canções de louvor a Deus, que cantava a caminho da escola. Os pais assistiam em assombrado silêncio à sua conversão, mas a devoção profunda de Einstein foi de curta duração, tendo terminado aos 12 anos. Nunca mais acreditou num deus pessoal, uma noção que descrevia como naïve. (…). Tal como Karl Marx (1818-83), Einstein passou a ver a religião como um opiáceo cuja função era entorpecer os sentidos das pessoas para não verem a monotonia do quotidiano, destruidora da alma, impedindo-as de pôr em causa o status quo. Emergiu deste paraíso religioso da juventude como um jovem revoltado que acredita que o Estado engana intencionalmente os jovens com mentiras.”

“Foram a ciência e a matemática que lhe abriram os olhos para o mundo real. Se existe algo em mim que possa ser chamado de religioso, escreveu pouco antes de morrer, é a admiração ilimitada pela estrutura do Universo até onde a nossa ciência a consegue revelar.”
“A partir dos 12 anos, Einstein destacou-se a matemática. Perante o recém-encontrado fascínio pela ciência e pela matemática, a religião ficou reduzida à insignificância. Também era bom em Latim e Grego, mas o Dr. Joseph Degenhart, seu professor de Grego, não se impressionou com isso e disse a Einstein que «nunca seria alguém». Também acusou Einstein de minar o respeito da turma, visto que rejeitava todo o tipo de autoridade. Os professores consideravam que aquele rapaz solitário e dado à leitura era pouco sociável e um potencial rebelde.”

“Mudanças dramáticas tiveram lugar na família, que teve de mudar-se para Milão. Einstein, com 15 anos, teve de ficar a viver sozinho numa pensão em Munique, para completar os últimos três anos de escolaridade. Mas, longe da família, era profundamente infeliz. Depois de seis meses de solidão, o médico apercebendo da crise pela qual Einstein estava a passar, deu-lhe um atestado médico a dispensá-lo das aulas por motivos de saúde. Foi ter com os pais a Milão, que ficaram chocados ao vê-lo aparecer.”

“O jovem que tinha como destino mudar o curso da ciência não teve um início auspicioso: aos 15 anos tinha abandonado a escola” (pp.21-25).

“Quando Einstein apareceu inesperadamente em Dezembro de 1894, os pais tiveram certamente receio que ele pudesse tornar-se um fardo. Ele procurou tranquiliza-los com planos para uma carreira de professor de Filosofia, mas Hermann e Pauline não ficaram particularmente impressionados com este «disparate filosófico». Acordaram que Einstein deveria seguir Engenharia Eléctrica. Como não podia ingressar numa universidade alemã sem o certificado do curso liceal, os pais decidiram que deveria concorrer ao Instituto Politécnico Federal Suíço, em Zurique, que aceitava estudantes mediante a realização de um exame de admissão” (p. 27).
(…).
“Normalmente, os candidatos ao exame de admissão ao Politécnico de Zurique tinham 18 anos, e o seu director, Albin Herzog, apenas permitiu que Einstein fizesse o exame quando lhe disseram que o jovem de 16 anos era um «menino-prodígio».”

Porém, Einstein não correspondeu às expectativas e chumbou.

“Todavia, o seu desempenho na parte científica do exame foi suficientemente impressionante para Heinrich Friedrich Weber, professor de Física, o convidar a assistir às suas aulas – uma honra pouco habitual, que deve ter tornado menos doloroso o fracasso.”

“Einstein teve de render-se às evidências e voltar para a escola, que ficava em Aarau, uma cidade suíça a 50 km de Zurique. Ficou alojado em casa da família de Jost Winteler, que tratava como pais.
Einstein era um ano mais novo do que os colegas, um dos quais, Hans Byland, descreveu-o mais tarde como um «suábio insolente»:

«Seguro de si, com chapéu de feltro cinzento descaído para trás sobre a farta cabeleira negra, caminhava a passos largos ao ritmo rápido, posso quase dizer louco, de um espírito inquieto que comporta em si mesmo o universo. Nada escapava ao olhar astuto dos seus olhos castanhos, grandes e brilhantes. Quem quer que com ele falasse sucumbia de imediato ao feitiço da sua personalidade superior. O trejeito sarcástico da sua boca carnuda de lábio inferior proeminente não encorajava os snobes a confraternizar com ele. Despreocupado por convenção, a sua atitude em relação ao mundo era a de um filósofo alegre e o seu humor inteligente fustigava cruelmente qualquer presunção ou pose».

“Esta forma romântica de o descrever retrata um jovem frontal, auto-confiante, cuja língua afiada protegia uma «vida emocional intensa» que ele expressava através do seu amor pela música. De facto, em Março de 1896, um professor de música escolheu Einstein para alvo dos seus elogios: «Um estudante chamado Einstein chegou mesmo a brilhar ao interpretar um adágio de uma sonata de Beethoven com profundo sentimento». Ganhou a reputação de ser um «lobo solitário« e um «cigano»., expressões que Einstein adoptava nas suas cartas” (pp. 28-30).

(…).
“Em Aarau, o Einstein adolescente desenvolveu-se tanto emocional como intelectualmente. E apaixonou-se por Marie Winteler, a filha de Jost Winteler, de 18 anos, a quem escreveu esta carta nestes termos:

«É maravilhoso poder encostar ao coração um pedaço de papel que dois olhinhos tão queridos contemplaram com amor e sobre o qual essas mãozinhas delicadas deslizaram docemente».

Einstein incorre com facilidade nalguma lamechice nas suas cartas de amor: ela era o seu

«anjinho maroto e adorado e só naquele momento se tinha apercebido de quão indispensável o meu querido raiozinho de sol se tornou para a minha felicidade»” (p. 31).

[Sensível, lamechas a rasar o ridículo. Humano, portanto]

“Einstein fez os exames finais em Setembro de 1896. Consistiam em sete provas escritas, bem como exames orais, que ele passou com distinção: teve média de 5,5 numa escala de 0 a 6 – a mais elevada da turma (teve nota máxima a Álgebra e a Geometria). No início de Outubro, Einstein matriculou-se no Politécnico de Zurique. Revela-se ansioso por estudar Matemática e Física em Zurique, com o objectivo de vir a ensiná-las” (pp. 31-32).
(…).
“Dos estudantes do seu ano. Marcel Grossmann tornou-se um amigo particularmente íntimo. Disse aos pais que «um dia este Einstein vai ser um grande homem». Ao contrário de Einstein, Grossmann era um estudante exemplar que assistia religiosamente às aulas e tirava apontamentos abundantes que eram muito úteis a Einstein quando revia a matéria. Einstein descrevia-se a si mesmo como um estudante medíocre, apenas capaz de se concentrar nos temas que lhe interessavam. Depois de alguns semestres, aprendi gradualmente a conviver com as culpas na consciência e fiz com que os meus estudos se adaptassem ao meu estômago intelectual e aos meus interesses. Seguia algumas aulas com um interesse profundo. Mas faltava a muitas outras e ficava em casa a estudar os mestres da física teórica com uma dedicação religiosa.”

[Interesses especialmente direccionados, portanto]

“Em Março de 1899, Jean Pernet, professor de Física Experimental, repreendeu-o oficialmente por assistir a poucas aulas. Pernet ficou furioso quando viu Einstein pôr de lado as instruções para uma experiência sem sequer as ler, mas quando se queixou de Einstein a um assistente ficou aborrecido quando este lhe respondeu que «as suas soluções estão correctas e os métodos que usa são sempre muito interessantes». Em Julho do mesmo ano, Einstein provocou uma explosão no laboratório e precisou de levar pontos numa mão depois de se ter ferido com bastante gravidade. Pernet foi muito duro: «Não há falta de empenho nem de boa vontade no seu trabalho, mas sim falta de capacidade». O erudito professor pensava que Einstein não estava à altura do rigor da Física e sugeriu-lhe que estudasse antes Medicina, Direito ou Filologia.”

“Embora no seu primeiro ano Einstein estivesse inscrito em mais cadeiras de Matemática do que os seus colegas, cedo decidiu que essa matéria não era essencial para o seu trabalho em Física – decisão de que mais tarde viria a arrepender-se. O seu professor de Matemática, Hermann Minkowski (1864-1909) – que viria a desenvolver o modelo quadridimensional de espaço-tempo a partir da teoria da relatividade restrita de Einstein, descreveu-o como um «mandrião». Antes do seu extraordinário trabalho na teoria da relatividade geral, Einstein considerava que a matemática desempenhava um papel deveras limitado.”

“A Física é essencialmente uma ciência intuitiva e concreta, disse. A Matemática é apenas uma forma de expressar as leis que regem os fenómenos. Nas suas Notas Autobiográficas, Einstein escreveu o seguinte sobre o tempo que passou no Poly e sobre a matemática:

Tive professores excelentes (por exemplo, Hurwitz e Minkowski) e, por isso, deveria ter tido uma formação matemática profunda. No entanto, passei a maior parte do tempo a trabalhar no laboratório de Física, fascinado pelo contacto directo com as experiências. Fundamentalmente, geri o tempo de modo a poder estudar em casa as obras de Kirchoff, Helmholtz, Hertz, etc. Até certo ponto negligenciei a Matemática, não só por me interessar mais pelas ciências naturais, mas também pela experiência peculiar que passo a descrever. Reparei que a Matemática estava dividida em várias especialidades e que cada uma delas, por si só, poderia facilmente absorver o curto período de vida que nos foi concedido. Consequentemente, encontrei-me na situação do burro de Buridan, que não conseguia decidir-se por nenhum fardo de palha em particular. Suponho que tal se deve ao facto de a a minha intuição não ser suficientemente apurada no campo da Matemática para distinguir com clareza a erudição fundamentalmente importante, que é eminentemente básica, da mais ou menos dispensável. Além disso, o meu interesse pelo estudo da natureza era sem dúvida mais forte. Quando era apenas estudante, não era óbvio para mim que o acesso a um conhecimento mais profundo dos princípios básicos da Física depende dos métodos matemáticos mais complexos. Só me fui apercebendo disso gradualmente após anos de trabalho científico independente” (pp. 37-40).

“O éter foi o tema do primeiro artigo científico de Einstein e o electromagnetismo continuava a estimular a sua imaginação. Nas suas aulas, Weber [professor] nunca falava em Maxwell, que morreu no ano de nascimento de Einstein. O programa da sua cadeira terminava na década de 1850, com o físico alemão Hermann von Helmholtz e a ciência termodinâmica: No final do curso, escreveu Einstein, sabíamos tudo sobre o passado da Física, mas nada sobre o seu presente e futuro. Deste modo, e para alargar os seus conhecimentos, Einstein familiarizou-se com uma física mais revolucionária lendo as obras de Ludwig Boltzmann (1844-19069, H. A. Lorenz (1853-1928) e Ernest Mach (1838-1916), cujo desafio aos conceitos absolutos do tempo e do espaço exerceram nele uma profunda influência.”

“O cepticismo e a independência de Mach fascinavam Einstein, como qualidades que ele próprio possuía em abundância. Certo dia, Weber disse-lhe, irritado: «És um rapaz muito inteligente, Einstein, um rapaz extremamente inteligente, mas tens um grande defeito: nunca aceitas que te digam nada». O facto de Einstein se dirigir sempre a Weber como Herr Weber e não como Herr Professor provava esta falta de respeito. Maja recorda que, mesmo em criança, Einstein ganhara junto do seu professor de música a reputação de «impertinente» – Segundo um dos seus biógrafos, a personalidade de Einstein impedia-o de se integrar no mundo da Física: «Sendo ao mesmo tempo afectuoso e distante, objectivo e abstracto, tocista e sério, o temperamento de Einstein excluía o pretensiosismo, a pompa e a inveja que irradiavam frequentemente dos seus colegas físicos.”

“Einstein tinha dificuldade em respeitar hierarquias sociais ou qualquer tipo de autoridade, o que, numa época obcecada por formalidades, lhe granjeou inimigos. Entre Weber e Einstein cresceu um antagonismo que viria a causar sérias dificuldades ao jovem em início de carreira. (…). Weber «estava cada vez mais insatisfeito com o aluno pouco ortodoxo que cortava demasiado a direito». Depois de terminar o curso, Einstein concorreu ao lugar de assistente de Weber, mas o professor rejeitou-o terminantemente. Três dos seus colegas conseguiram o lugar de assistentes no Poly, o que levou Einstein a desconfiar que Weber estaria mesmo a tentar sabotar as suas oportunidades de conseguir um lugar em qualquer outro sítio.” (…).

“O que atraiu Einstein a Aarau nos seus tempos de estudante foi a independência e a liberdade que uma carreira científica oferecia. Sou um verdadeiro «viajante solitário», escreveu em 1930, e nunca pertenci, de alma e coração, nem ao meu país, nem à minha casa, nem aos meus amigos, nem mesmo à minha família mais próxima. Quer isto dizer que nunca perdi o sentido do distanciamento e a necessidade de solidão.”

“Enfrentou o início da sua carreira científica completamente isolado da comunidade da Física.”

“Ironicamente, a partir da década de 1920, Einstein voltou a ser a voz solitária da Física, já que criticava o desenvolvimento da teoria quântica. Mas o esplendor da sua visão da estrutura do Universo era tal que a ciência não pôde ignorá-lo por muito tempo” (pp. 41-43).
(…).
“Einstein apaixonou-se pela sua colega Mileva Maric em Zurique. Casaram-se em 1903, mas só há relativamente pouco tempo, com a publicação das suas cartas de amor, foi revelada a história completa do seu complicado relacionamento.”
“A correspondência de Einstein, que está a ser gradualmente publicada, veio expor uma nova e menos lisonjeira faceta da sua personalidade, revelando «um homem cujas declarações públicas e vida privada se encontravam permanentemente em conflito, e cuja serenidade aparente escondia uma grande turbulência interior». O grande físico, que em tom de brincadeira se apelidava de santo judeu, era apenas humano” (p. 44).

“Nem mesmo nas cartas de amor a ciência se afasta do pensamento de Einstein. Palavras de ternura partilham a mesma frase com grandes nomes da Física. Em Agosto de 1899, enquanto passava férias com a sua mãe protectora e a irmã, Einstein escreveu que elas lhe pareciam mesquinhas e ignorantes, e ansiava pela companhia de Mileva: Compreendemos tão bem as nossas almas soturnas…”

[A mulher que tinha os mesmos objectivos, portanto. Mas que viria a falhar…]

“Como comenta um dos seus biógrafos, embora Einstein fosse «uma pessoa viajada para o seu tempo», nunca se tinha cruzado com nada tão exótico como uma mulher da Física. A companhia feminina que tivera até então tinha sido de mulheres burguesas e cultas. Apesar de o acompanharem ao piano quando tocava violino, eram incapazes de o acompanharem intelectualmente. Mas Mileva era diferente, o que o deixou completamente apaixonado:”

“Tenho tanta sorte em ter-te encontrado, uma criatura que é minha semelhante e que, tal como eu, é forte e independente! Sinto-me só ao pé de toda a gente, menos de ti.”

“Milana Bota, uma colega sérvia, diria de Milena, quando escreveu à mãe: «Parece ser uma rapariga muito bondosa, inteligente e séria; pequena, delicada, morena e feia».
Susane, filha da senhoria de Einstein, reparou que este trabalhava frequentemente com Mileva, e descreveu-a como «uma criatura modesta e sem pretensões». Reparou também como uma vez Einstein saltou em defesa de Mileva: «Um dia, referindo-se ao facto de ela coxear, um colega de Einstein disse “Nunca teria coragem de casar com uma mulher que não fosse completamente sã”. Ao que Einstein respondeu sem perder a calma:”

«Mas ela tem uma voz tão encantadora».

“(…) tal como na ciência, Einstein tinha o dom de ver para além da superficialidade, até à beleza interior “(pp.46-47).

(…).
“Ansiava por voltar a estar junto de Mileva em Zurique, a estudar e a beber café:”

«Mal posso esperar para te ter de novo nos braços, minha mais-que-tudo, minha safadinha, meu diabinho de saias, minha malandreca!»

“Orgulhoso, contou-lhe que tinha deixado de ir ao barbeiro, pois aprendera a barbear-se:”

«Vais ver, Bonequinha! Posso sempre barbear-me enquanto tu estás a fazer o café para o almoço, para não ficar a marrar nos livros como de costume, enquanto a pobre da Bonequinha tem de cozinhar e o preguiçoso do Juquinha se refastela depois de obedecer à pressa à voz de comando: «mói isto» (p. 51).

“Às preocupações do casal com o casamento, juntava-se a necessidade não menos urgente de arranjar emprego. Einstein tinha esperado conseguir um lugar de assistente no Poly, mas nem Pernet nem Weber o aceitaram. Assim, teve de procurar trabalho como professor particular. (…). Quando Einstein regressou de Zurique no Outono, ganhava algum dinheiro a dar aulas oito horas por semana e a fazer cálculos para Alfred Wolfer (1854-1931) no Observatório Federal Suiço. Em Outubro, numa carta a Helene Kaufler, classificou a sua vida precária: Como a minha Bonequinha chegou ontem com a irmã, passo o dia todo em casa dela, como de costume. Nenhum de nós tem emprego, sustentamo-nos com as aulas particulares que damos – quando conseguimos algumas, o que continua a ser muito incerto” (p. 52).

“Durante a Primavera de 1901, Einstein tentou desesperadamente encontrar um lugar como assistente, o primeiro degrau da hierarquia académica. Em pouco tempo já terei honrado todos os físicos, do Mar do Norte à ponta sul da Itália, com a oferta dos meus préstimos, escreveu a 4 de Abril.”

(…).
“Preocupado, o pai de Einstein escreveu, sem o filho saber, ao grande químico Wilhelm Ostwald (1853-1932), pedindo-lhe para ajudar o filho. Ostwald não respondeu, mas dez anos mais tarde viria a nomear Einstein para o Prémio Nobel” (p.53).

“(…). Mileva [ainda antes de ter casado com Einsten] dera à luz uma menina. (…). O destino da filha de Einstein continua a ser um mistério. Muitos documentos desapareceram (…)” (p. 59).

(…). [Aquando da visita de Max Talmud]:

“que ficou chocado com a «imensa pobreza» em que Einstein vivia. Tinha sido imprudente da parte dele ir para Berna antes de a repartição de patentes lhe ter feito uma proposta de trabalho definitiva. Einstein não tinha qualquer mesada e o pouco que poupara das aulas que dera não duraria muito. Deste modo, uma das primeiras coisas que fez foi colocar um anúncio num jornal a oferecer aulas particulares de Matemática e Física. O homem que pouco tempo depois viria a ser aclamado como o maior físico desde Isaac Newton até oferecia aulas à experiência” (pp. 60-61).

(…).
No final de Maio de 1902, Einstein teve finalmente uma entrevista com Friedrich Haller, o director da repartição de patentes. Einstein impressionou Haller, começando por isso a trabalhar no dia 23 como Perito Técnico de Terceira Classe. O pior dos problemas monetários de Einstein chegara ao fim (p. 63).
(…)

“«Era viciado em charutos», diz um biógrafo, «nos mais longos, nos mais grossos e nos mais escuros que conseguisse encontrar. Fumava-os uns atrás dos outros; por isso, ainda jovem, já tinha os dentes manchados de castanho e a voz rouca. A sua voz foi ficando cada vez mais fraca, mas nem assim parou de fumar»” (p. 69).

“De Março a Junho de 1905 Albert Einstein, funcionário da Repartição de Registo de Patentes de Berna, elaborou quatro artigos científicos que transformariam a visão que tínhamos do mundo e afectariam profundamente o curso da Física no futuro. Como se isso não bastasse, em Setembro escreveu uma breve reflexão sobre um deles, na qual sublinhava a relação entre energia e matéria. Estas três páginas teriam um impacto avassalador na história mundial, já que despertaram a atenção dos cientistas para o poder letal encarcerado em cada átomo, como exprimia a equação hoje lendária E= mc²” (p. 70).

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“A 7 de Maio de 1909, com trinta anos de idade, Einstein foi nomeado professor assistente de Física Teórica da Universidade de Zurique. Tornava-se finalmente, como disse Laub com a sagacidade que o caracterizava, membro oficial da associação de prostitutas” (p. 89).

“No mês em que começou a dar aulas na Universidade de Zurique, Wilheem Ostwald nomeou-o para o Prémio Nobel. Contido, foi preciso mais de uma década para que a comissão se sentisse à vontade para conceder tal honra a Einstein. O lugar do génio da Física no seio da comunidade científica estava agora assegurado. A insegurança dos primeiros anos foi esquecida e os colegas notaram nele uma nova confiança. O físico e pacifista Friedrich Adler (1879-1960), que morava no apartamento por baixo do deles, escreveu que Einstein tinha a mente mais independente da Física: «A maioria dos cientistas nem sequer percebe o método que ele utiliza»” (p. 90).

“Um amigo de Zurique descreve a abordagem invulgar de Einstein à paternidade.”

«A porta do apartamento estava aberta para deixar secar bem o chão, que tinha sido acabado de lavar. Entrei no quarto de Einstein. A sua atitude era claramente filosófica, a embalar com uma mão o berço onde estava uma criança. Na boca,Einstein tinha um péssimo charuto, e na outra mão um livro aberto. O fogão fumegava assustadoramente. Como era possível ele suportar aquilo?» (p. 92).

” Mal se espalhou a notícia de que ele poderia deixar Zurique, os seus alunos dirigiram uma petição ao Departamento de Educação, elogiando o «extraordinário talento que Einstein tinha para expor os problemas mais difíceis da física teórica de uma forma muito clara». Tal como disse um dos signatários da  petição, este professor boémio «que usa roupas muito puídas e calças demasiado curtas» tinha «tocado os nossos corações». Os alunos gostavam da atmosfera relaxante das aulas de Einstein, que frequentemente acabavam com a pergunta: Quem quer vir ao Café Terrasse?”

“A sua popularidade rendeu-lhe um aumento de 1000 francos no salário a partir de Outubro de 1910, mas em Setembro já se sabia que ele iria mesmo para Praga” (p. 93).

“Tal como o professor Minkowski (que morreu em 1909) se queixava frequentemente, Einstein nunca foi bom a em matemática. Já de regresso a Zurique, o seu amigo Marcel Grossmann, agora professor de matemática no Politécnico, dar-lhe-ia a ajuda matemática necessária para desenvolver a sua nova teoria revolucionária.” (…)

“Actualmente estou a trabalhar exclusivamente no problema da gravitação e creio que conseguirei ultrapassar todas as dificuldades com a ajuda de um matemático daqui amigo meu. Mas uma coisa é certa: nunca trabalhei tanto em toda a minha vida, e isto fez-me ganhar um enorme respeito pela Matemática, cujas partes mais subtis eu tinha considerado até hoje, na minha ingenuidade, um mero luxo. Comparada com esse problema, a teoria da relatividade restrita é uma brincadeira de criança”s (p. 98).

“Após muitas madrugadas de ilusão em que pensava ter resolvido o problema, Einstein encontrou finalmente a solução em Novembro de 1915. A teoria da relatividade geral, que ele anunciou na Academia de Ciências Prussiana, explicava com sucesso o avanço do periélio de 43 segundos do arco por século. Os anos de paciência e meticulosa investigação científica tinham valido a pena. Durante dias não cabia em mim de contente, de tão empolgado que estava, escreveu Einstein a Ehrenfest em Janeiro de 1916. Foi uma «grande obra de arte», segundo o físico alemão Max Born (1882-1970), «a maior proeza do pensamento humano sobre a natureza, a combinação mais maravilhosa de visão filosófica, intuição física e capacidade matemática»” (p. 103).

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