“A miséria de uma criança interessa a uma mãe, a miséria de um rapaz interessa a uma rapariga, a miséria de um velho não interessa a ninguém.”
Victor Hugo in “Os Miseráveis”
“O termo «idadismo» (em inglês ageism) surgiu pela primeira vez em 1969 quando o psicólogo americano Robert Butler procurava explicar as reacções negativas de uma comunidade à construção de um empreendimento imobiliário para pessoas idosas na sua vizinhança. Estas reacções da comunidade pareciam, à primeira vista, inexplicáveis, já que de nenhum modo os futuros residentes pareciam constituir ameaças à localidade.
Após uma reflexão mais aprofundada sobre os motivos deste tipo de comportamentos, Butler compreendeu que apenas um factor parecia guiar a recusa dos habitantes locais e este estava relacionado com a idade dos inquilinos. Tornou-se explícito que os envolvidos não estavam satisfeitos por terem um empreendimento imobiliário para pessoas idosas na proximidade das suas residências, talvez motivados por uma crença de que este tipo de construção poderia diminuir o valor e o prestígio da vizinhança.
Desde a introdução do termo, têm sido feitos vários esforços, com algum êxito, para a identificação de manifestações idadistas na sociedade americana. Neste momento, são bastante conhecidas as diferentes formas que este tipo de atitudes pode assumir e as suas especificidades. Do mesmo modo, outros países – como, por exemplo, o Reino Unido e a Suécia – têm também iniciado um trabalho bastante exaustivo no sentido de identificar e eliminar este tipo de manifestações contra as pessoas mais velhas. Estes trabalhos têm ajudado na consolidação da noção de idadismo e das suas implicações.
Em termos gerais, o idadismo refere-se às atitudes e práticas negativas generalizadas em relação aos indivíduos baseadas somente numa característica – a sua idade. A tradução do termo ageism para idadismo tem sentido porque podemos pensar em manifestações idadistas contra diferentes grupos etários (e não só contra as pessoas idosas como poderíamos ser levados a pensar). Por exemplo, existem elementos que apontam para que, em certos países como o Reino Unido, o idadismo é direccionado sobretudo contra as pessoas mais jovens. Em Portugal, por seu lado, o idadismo parece atingir sobretudo as pessoas mais velhas. (…) A este tipo especial de idadismo alguns autores têm chamado, por vezes «gerontismo».
As atitudes idadistas em relação às pessoas mais velhas assumem três componentes essenciais. Em primeiro lugar, o idadismo está associado às crenças ou aos estereótipos que temos relativamente às pessoas idosas. Refere-se à tendência para percebermos todas as pessoas de uma determinada idade como um grupo homogéneo, que se caracteriza muito frequentemente por determinados traços negativos como, por exemplo, a incapacidade e a doença.
Em segundo lugar, as atitudes idadistas estão relacionadas com o preconceito ou os sentimentos que temos em relação a este grupo etário. O idadismo pode manifestar-se através de sentimentos de desdém em relação ao envelhecimento e às pessoas mais velhas, embora, muitas vezes, assuma formas mais disfarçadas como a piedade ou o paternalismo.
Finalmente, podemos pensar que o idadismo inclui também uma componente mais comportamental e que está relacionada com os actos efectivos de discriminação em relação às pessoas idosas. São muitos os exemplos de discriminação na nossa sociedade, mas talvez o mais exemplificativo seja o abuso e os maus tratos que têm como alvo os indivíduos deste grupo etário.
É importante compreender que o idadismo não pode ser definido apenas de modo individual, , mas sobretudo ao nível institucional e cultural.
O idadismo não é apenas uma atitude negativa, individualizada em relação às pessoas idosas,
mas espelha os nossos valores culturais mais profundos e as práticas institucionais da nossa sociedade.
(…) existem dados que demonstram que vivemos numa sociedade predominantemente idadista em relação às pessoas mais velhas
e que esta ideia tem sido perpetuada pelas instituições que nos rodeiam e às quais pertencemos.
O idadismo é um problema grave na sociedade portuguesa.”
Bibliografia
MARQUES, Sibila. (2011). Discriminação da Terceira Idade. Fundação Francisco Manuel dos Santos. Lisboa. pp. 17-19.