Crer ou não crer: eis a questão!

Publicado por: Milu  :  Categoria: Crer ou não crer..., PARA PENSAR

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“Um espírito crédulo… tem grande prazer em acreditar em coisas estranhas, e quanto mais estranhas estas são, mais fácil lhe é aceitá-las; mas nunca considera as que são simples e viáveis, pois nestas todos os homens podem acreditar”

Samuel, Butler, Characters (1667.69)

Resumo do que devemos saber sobre OVNIs, Aliens e as figuras geométricas, alegadamente um código de comunicação, ou linguagem geométrica, de seres extraterrestres com seres humanos.

Todos estes apontamentos foram retirados do livro intitulado “Um Mundo Infestado de Demónios” de Carl Sagan, o cientista astrofísico. Um digno representante do conceito de Terceira Cultura, tal como poderemos constatar no trecho abaixo e com o qual dou início ao verdadeiro propósito deste post, que é incentivar o cepticismo. Os títulos e observações entre parêntesis rectos são da minha autoria. Como não sou dada a sensacionalismos, acredito que as teorias presentes neste livro continuem actuais.

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[A treta dos alienígenas]

 

” Ainda está escuro lá fora. O leitor está na cama, bem acordado. Descobre que está completamente paralisado. Sente a presença de alguém dentro do quarto. Tenta gritar. Não consegue. Alguns seres pequenos e cinzentos, com menos de 1,20 m de altura, estão aos pés da cama. Têm a cabeça em forma de pêra, demasiado grande para o corpo, e são calvos. Os olhos são enormes, os rostos são idênticos e inexpressivos. Vestem túnicas e calçam botas. O leitor espera que isto seja apenas um sonho. Mas, aparentemente, está a acontecer de verdade. Eles levantam-no e, numa cena sobrenatural, transportam-no para fora do quarto atravessando a parede e deixam-no  a pairar no ar. Eleva-se em direcção a uma nave espacial metálica em forma de disco voador. Uma vez no interior desta, é escoltado até a uma sala de exames médicos. Um ser maior, mas semelhante – manifestamente um médico -, encarrega-se de si. O que se segue é ainda mais aterrador (Sagan, 1998. 73-74).

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(…) “Como revelaram repetidas sondagens ao longo dos anos, a maioria dos Americanos acredita que estamos a ser visitados por seres extra-terrestres em OVNI” (Sagan, 1998: 74).

[Ora, tendo em conta este tipo de relatos,  uma questão se impõe:]

(…).

“Por que razão haveriam seres tão avançados na física e na engenharia – que percorrem grandes distâncias interestelares e atravessam paredes como fantasmas -, de estar tão atrasados no que se refere à biologia? E, se os alienígenas estão a tentar fazer as coisas em segredo, não podiam perfeitamente apagar os raptos de todas as memórias? Seria muito difícil para eles consegui-lo? Por que motivo os instrumentos de exame são macroscópicos e tão parecidos com os que podemos encontrar na clínica ao pé de nossa casa? Porquê darem-se ao trabalho de contactos sexuais repetidos entre alienígenas e seres humanos? Por que não roubar alguns óvulos e alguns espermatozóides, ler o código genético completo e depois fabricar quantas cópias quisessem com as variações genéticas mais do seu gosto? Mesmo nós, seres humanos, que ainda não somos capazes de atravessar rapidamente o espaço interestelar ou de passar através de paredes, sabemos fazer a clonagem de células” (Sagan, 1998: 75-76).

[A treta dos “Discos Voadores”]

 

“(…). Muitas pessoas pareciam ver discos voadores – pessoas sensatas, pilares da comunidade, como agentes da polícia, pilotos da aviação comercial, ou militares. E, descontando alguns risinhos de escárnio, não consegui descobrir quaisquer argumentos em contrário. Como podiam todas estas testemunhas estar enganadas? Além disso, os discos voadores tinham sido detectados no radar e havia fotografias deles, que foram publicadas em jornais e revistas sofisticadas. Apareceram mesmo notícias de discos voadores que se tinham despenhado e de pequenos corpos alienígenas com dentes perfeitos, deitados, rígidos, em frigoríficos da Força Aérea, no Sudoeste.

O clima reinante foi resumido na revista Life, alguns anos mais tarde, nos seguintes termos: «Estes objectos não podem ser explicados pela ciência actual como fenómenos naturais – mas apenas como engenhos artificiais, criados e dirigidos por uma inteligência superior.» Nada de «conhecido ou projectado na Terra poderia ser responsável pelo seu funcionamento»” (Sagan, 1998: 77-78).

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(…).

“Na Universidade, no início da década de 50, comecei a aprender o modo como a ciência funciona, os segredos dos seus grandes sucessos, que os critérios de prova têm de ser muito rigorosos se quisermos realmente saber se uma coisa é verdadeira, que a história do pensamento humano está pejada de falsas partidas e de becos sem saída e que, muitas vezes, as crenças mantidas e apoiadas pelas hierarquias políticas, religiosas e académicas se revelam, não ligeiramente erradas, mas grosseiramente falsas (Sagan, 1998: 74).

(…).

Exemplo:

“É longa a história de pretensões espúrias de que o magnetismo pode curar doenças. (…). Mas o personagem chave foi Franz Mesmer. Eu tinha a ideia vaga de que o termo «mesmerizar» significava qualquer coisa semelhante a hipnotizar. (…). Nas sessões que organizava, os nobres reuniam-se numa sala mergulhada na obscuridade. Mesmer, que envergava uma túnica de seda com flores douradas e agitava uma varinha de marfim, fazia sentar os crédulos participantes em torno de uma tina com ácido sulfúrico diluído. O magnetizador e os seus jovens assistentes olhavam fixamente nos olhos os seus pacientes e esfregavam-lhes os corpos. Agarravam em barras de ferro imersas na solução ou seguravam as mãos uns dos outros. Numa exaltação contagiosa, as curas dos aristocratas – especialmente jovens – sucediam-se à esquerda e à direita.

Mesmer tornou-se uma sensação. Chamou àquilo «magnetismo animal». (…). A Academia das Ciências Francesa nomeou uma comissão que integrava o químico Antoine Lavoisier e o americano Benjamim Franklin, diplomata e especialista em electricidade. Estes efectuaram a experiência de controlo óbvia: quando os efeitos magnetizadores eram obtidos sem o conhecimento do doente, não se verificaram curas. Assim, a comissão concluiu que, a haver curas, estas residiam todas na mente dos espectadores. Mesmer e o seus adeptos não desarmaram. Mais tarde, um deles prescreveu a seguinte atitude mental para a  obtenção dos melhores resultados (Sagan, 1998: 79-80):

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“Desde a infância, desde muito antes de ter ouvido falar em discos voadores, que me interesso pela questão da possibilidade de vida extraterrestre. E o meu fascínio manteve-se muito depois do meu entusiasmo inicial pelos OVNI ter desaparecido, à medida que fui aprendendo mais sobre o capataz impiedoso a que se chama o método científico: tudo depende das provas. Relativamente a questões tão importantes, a prova tem de ser incontestável. Quanto mais quisermos que uma coisa seja verdade, mais prudentes teremos de ser. Nenhum testemunho em segunda mão é suficiente. As pessoas cometem erros. As pessoas pregam partidas. As pessoas deformam a verdade por dinheiro ou para captar atenção ou conseguir fama. As pessoas, por vezes, interpretam mal aquilo que vêem. As pessoas, por vezes, vêm coisas que não estão lá.

Todos os casos de OVNI eram essencialmente episódios curiosos que alguém asseverava serem verdadeiros. Os OVNI foram descritos de modos diversos, como objectos em deslocação rápida ou a pairar; com a forma de um disco, de um charuto ou de uma bola; deslocando-se em silêncio ou com ruído; deixando um rasto flamejante ou sem rasto nenhum; acompanhado de luzes intermitentes ou com um brilho uniforme, prateados ou luminosos. A diversidade das observações indicava que não tinham uma origem comum e o uso de termos como OVNI ou «discos voadores» serviu apenas para confundir a questão e agrupar genericamente um conjunto de fenómenos não relacionados entre si.

Havia qualquer coisa de estranho com a própria invenção da expressão «disco voador». Enquanto estou a escrever este capítulo, tenho diante de mim a transcrição de uma entrevista, ocorrida em 7 de Abril de 1950, entre Edward R: Murrow, o célebre jornalista da CBS, e Kennet Arnold, um piloto civil que, em 24 de Junho de 1947, viu uma coisa esquisita perto de Mount Rainier, no estado de Washington, e que, de certo modo, consagrou a expressão, Arnold afirma que os jornais

«não me citaram correctamente… Quando contei à imprensa, eles reproduziram mal o que eu disse e, naquela excitação toda, um jornal, e depois outro, embrulharam tanto a questão que já ninguém sabia exactamente do que estavam a falar… De certo modo, estes objectos oscilavam como se fossem, diria eu, barcos em águas agitadas… E, quando descrevi como voavam, disse que voavam como se fossem discos atirados sobre a água. A maior parte dos jornais percebeu mal e citou mal. Disseram que eu afirmei que eram semelhantes a discos; o que eu disse foi que voavam como um disco.”

(…)

“A maioria das pessoas relatou honestamente aquilo que viu, mas o que viam eram fenómenos naturais, embora invulgares. Alguns dos OVNI avistados revelaram-se aeronaves pouco convencionais, aviões convencionais com luzes dispostas de forma pouco habitual, balões de altitude, insectos luminescentes, planetas observados em condições atmosféricas invulgares, miragens ópticas e nuvens lenticulares, relâmpagos em forma de bola, parélios, meteoros, incluindo bolas de fogo verdes, e satélites, ogivas e foguetes auxiliares que reentram na atmosfera com efeitos espectaculares. (…).”

“Quando notamos qualquer coisa estranha no céu, há quem fique muito excitado e perca o juízo crítico, tornando-se uma testemunha pouco fiável. (…) (Sagan, 1998: 80-82).

” A história original do disco voador que se despenhou (com os pequenos alienígenas e os seus dentes perfeitos) revelou-se uma impostura completa. (…). Frank Scully, colunista da Variety publicou a história: Dezasseis alienígenas mortos provenientes de Vénus, com 90 cm de altura, tinham sido encontrados num disco voador que se despenhara juntamente com outros dois. Haviam sido recuperados folhetos com pictogramas alienígenas. Os militares estavam a encobrir a história. As implicações eram profundas.

Os burlões eram Silas Newton, que afirmava utilizar ondas de rádio para a prospecção de ouro e de petróleo, e um misterioso «Dr. Gee», que se verificou ser um tal Mr. GeBauer. Newton mostrou uma roda dentada da maquinaria do OVNI e apresentou fotografias com grandes planos do disco voador. Mas não permitiu uma inspecção pormenorizada. Quando um céptico preparado, com um truque de prestidigitação, trocou a roda dentada por outra e mandou analisar o artefacto, verificou-se que este era feito de alumínio de uma panela de cozinha (Sagan, 1998: 83).

(…).

“Na história dos círculos que apareceram nas searas podemos ver como são modestas as nossas expectativas sobre os alienígenas e como são pobres os critérios de prova que muitos de nós estamos dispostos a aceitar. Foi uma coisa muito estranha que teve origem na Grã-Bretanha e se espalhou pelo resto do mundo.

Agricultores ou simples pessoas que passavam descobriram círculos (e, nos últimos anos, pictogramas muito mais complexos) marcados em campos de trigo, aveia, cevada e colza. Começando com simples círculos em meados da década de 70, o fenómeno ampliou-se de ano para ano, até que, nos finais dos anos 80 e início dos anos 90, o campo, especialmente no Sul de Inglaterra, foi contemplado com figuras geométricas imensas, algumas do tamanho de um campo de futebol, marcadas nas searas antes da colheita – círculos tangentes a círculos mais pequenos colocados simetricamente – o que só podia ter sido provocado, conforme se concluiu rapidamente, por um disco voador e os seus quatro suportes de aterragem.

(…).

“Foram adiantadas muitas conjecturas menos convencionais. Pessoas com alguma formação científica examinaram os locais, produziram teorias, criaram revistas completamente devotadas ao assunto. As figuras seriam provocadas por estranhos remoinhos de vento chamados «vórtices colunares», ou mesmo por outros, ainda mais estranhos, que têm o nome de «vórtices anelares»? E os relâmpagos em bola? Investigadores japoneses tentaram simular, em laboratório e em pequena escala, a física do plasma que eles pensavam estar a operar no longínquo Wiltsshire.

Mas, especialmente nos casos em que as figuras formadas nas searas se revelaram mais complexas, as explicações meteorológicas ou eléctricas tornaram-se forçadas. Os desenhos eram certamente feitas por OVNI e eram os alienígenas a comunicar connosco numa linguagem geométrica.

Ou talvez fosse o Diabo, ou a Terra sofredora a queixar-se das depredações que lhe foram infligidas pela mão do homem (Sagan, 1998: 85).

(…).

“Em 1991, dois sujeitos de Southampton, Doug Bower e Dave Chorley, anunciaram que andavam há quinze anos a desenhar figuras nas searas. (…). A breve trecho apareceram outras figuras desenhadas nas searas no Sul de Inglaterra e noutros locais. Tinham surgido imitadores. Bower e Chorley gravaram uma mensagem de resposta na seara: «WEARENOTALONE». Mesmo isto pareceu a alguns uma genuína mensagem extraterrestre (…).

Ao jeito de CONCLUSÃO

“Não é preciso ter um grau académico avançado para dominar os princípios do cepticismo, como demonstra qualquer comprador bem sucedido de um carro em segunda mão. A ideia geral de uma aplicação democrática do cepticismo é que toda a gente devia dispor das ferramentas essenciais para avaliar de uma forma eficaz e construtiva qualquer pretensão de conhecimento. Tudo o que a ciência pede é que se usem os mesmos níveis de cepticismo que utilizamos quando compramos um carro usado ou na avaliação da qualidade dos analgésicos ou da cerveja que vemos anunciada na televisão” (Sagan, 1998: 89).

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Bibliografia

SAGAN, Carl. (1998). Um Mundo Infestado de Demónios. Gradiva. Lisboa.

 

Um vídeo para um momento bem disposto, de Herman José, alguém que, definitivamente, marcou um tempo na história do humor em televisão no nosso país. Quando Herman fez este programa fartei-me de rir com estas cenas. Não há dúvida de que a melhor resposta para este tipo de embustes e crendices, é fazermos troça.